Wang Huning, um dos mais influentes e discretos membros do Comitê Permanente do Politburo do Partido Comunista Chinês (PCCh), está no núcleo de uma novidade estratégia de Pequim para enfraquecer Taiwan. Ao invés de recorrer exclusivamente a pressões militares e econômicas, Wang lidera uma ofensiva ideológica e propagandística com o objetivo de moldar a opinião pública na ilhéu e pavimentar o caminho para uma eventual reunificação sob os termos do regime comunista.
Dissemelhante de outros membros do cocuruto escalão do PCCh, Wang, de 69 anos, mantém um perfil reservado. Ele não é publicado por discursos inflamados ou aparições públicas frequentes, mas sim por sua habilidade estratégica e sua influência nos bastidores.
Considerado o principal ideólogo do partido comunista e principal mentor do ditador Xi Jinping, Wang é publicado por sua visão sobre o papel da propaganda uma vez que instrumento de controle social e de expansão ideológica. Ele é responsável de diversos livros que analisam o poder da cultura e da ideologia no fortalecimento do Estado, e, desde sua subida à escol do partido comunista, se tornou o arquiteto de diversas políticas de propaganda que promovem o chamado “socialismo com características chinesas”.
“Ele tem a total confiança do principal líder […] a influência de Wang Huning tem sido na ideologia, mas agora, na China sob Xi Jinping, a ideologia conecta tudo”, disse ao The New York Times o cientista político Chiu Kun-hsuan, professor emérito da Universidade Nacional Chengchi, de Taiwan.
Quem é Wang Huning?
Nascido em Xangai, em 1955, Wang Huning construiu sua carreira como professor de ciência política antes de ingressar no Partido Comunista Chinês nos anos 1990. Sua habilidade intelectual rapidamente o levou ao topo da hierarquia do regime. Além de Xi Jinping, Wang também foi o principal conselheiro ideológico dos ditadores Jiang Zemin (1993-2003) e Hu Jintao (2003-2013), os antecessores de Xi.
Sua ascensão à elite política chinesa deve-se, em grande parte, à sua capacidade de moldar e adaptar a narrativa do regime em um cenário global cada vez mais desafiador. Wang é apontado como um dos autores da ideologia “Sonho Chinês”, promovida por Xi como uma visão de revitalização nacional, e como o arquiteto da estratégia de controle social baseada em tecnologias de vigilância e censura.
“Ele é um esteticista político, muito bom em usar cosméticos para maquiar políticas e slogans políticos, incluindo a política externa”, disse à agência Reuters em 2022 Willy Lam, pesquisador do think tank Jamestown Foundation, dos EUA. “Todos os principais slogans, de Jiang Zemin a Hu Jintao e Xi Jinping, parecem ter vindo de Wang Huning”, acrescentou.
A estratégia contra Taiwan
Em sua abordagem para Taiwan, Wang Huning aposta em uma guerra de narrativas para minar a identidade taiwanesa e reforçar a ideia de que a ilha faz parte da China. Essa ofensiva inclui o uso de plataformas digitais, programas de intercâmbio cultural e a disseminação de conteúdos pró-China nas mídias sociais taiwanesas. O objetivo é dividir a sociedade local, enfraquecer o apoio à independência e promover uma imagem favorável da reunificação.
Sob a liderança de Wang, o PCCh intensificou os esforços para influenciar diretamente a política taiwanesa. Pequim tem financiado candidatos políticos e grupos de interesse na ilha que apoiam uma aproximação com o regime chinês. Além disso, a ditadura de Pequim vem ampliando sua rede de desinformação, criando narrativas falsas para desacreditar os defensores da soberania de Taiwan.
Wang supervisiona iniciativas que promovem visitas de figuras taiwanesas, principalmente de membros do partido Kuomintang (KMT), que é pró-China, ao continente, e campanhas midiáticas que amplificam mensagens pró-unificação. Um dos elementos-chave da estratégia é a reafirmação do chamado “Consenso de 1992”, interpretado por Pequim como aceitação do princípio de “uma só China”, com Taiwan como parte integrante do regime comunista continental.
Uma ameaça para a independência de Taiwan
A postura de Wang Huning reflete o atual compromisso do PCCh em trazer Taiwan para o controle de Pequim, um objetivo central da política externa chinesa. Para as autoridades da ilha, essa campanha de propaganda representa uma ameaça direta à democracia e ao desejo da população de permanecer independente. Com Wang, Pequim está claramente apostando que, ao invés de uma invasão militar, pode alcançar seus objetivos por meio de uma conquista ideológica.
Os esforços de Wang estão alinhados com a estratégia geral do ditador Xi Jinping, que já afirmou que a “reunificação pacífica” com Taiwan é essencial para o “rejuvenescimento nacional da China”. Entretanto, Xi também deixou claro que não descartaria o uso da força caso esses esforços falhem.
Embora a estratégia de Wang seja ambiciosa, ela enfrenta desafios significativos. A maioria dos taiwaneses rejeita firmemente a ideia de reunificação com a China. Pesquisas recentes mostram que o apoio à permanência do status quo da ilha está em alta, impulsionado pela repressão de Pequim em Hong Kong e pelas ameaças constantes no Estreito de Taiwan. Ainda assim, Wang Huning continua a ser uma figura-chave no amplo e diverso esforço de Pequim para conquistar a ilha democrática.
Os Estados Unidos, principal aliado de Taiwan, têm acompanhado de perto as movimentações de Pequim. Apesar de não reconhecer a ilha como um país, Washington, que possui um acordo de defesa com Taiwan, já alertou sobre a crescente influência chinesa em plataformas digitais e redes sociais do país, classificando essas ações como parte de uma guerra híbrida. Além disso, o governo norte-americano tem reforçado seu apoio à Taiwan por meio de vendas de armas e visitas diplomáticas de alto nível.
O novo presidente de Taiwan, Lai Ching-te, um padroeiro ferrenho da soberania da ilhéu, tem alertado repetidamente sobre a ameaço representada pelas tentativas de infiltração de Pequim. Lai já afirmou que Taiwan não cederá à pressão chinesa e continuará a tutelar sua liberdade e democracia. Aliás, o governo taiwanês está trabalhando com aliados internacionais para identificar e bloquear redes de desinformação ligadas ao regime chinês.