Na segunda-feira da semana passada, dia 4, o governo do Paraná enviou à Assembleia Legislativa do estado um projeto de lei prevendo a privatização da Companhia de Tecnologia da Informação e Comunicação do Paraná (Celepar), que gerencia vários dados digitais dos paranaenses relativos a serviços públicos, desde o pagamento de impostos e taxas estaduais até as notas de estudantes da rede pública e históricos médicos de pacientes do SUS, passando por infrações de trânsito. Um assunto que deveria ser discutido com profundidade, mas que será alvo de um novo “tratoraço” por parte do governo estadual e por sua maioria na Alep, já que a votação do projeto de lei pode ocorrer já nesta terça-feira, dia 12, ou seja, apenas oito dias depois que o texto foi protocolado no Legislativo estadual.
A Gazeta do Povo defende, em consonância com o princípio da subsidiariedade, que a participação direta do Estado na economia deve ocorrer apenas naquelas áreas em que a iniciativa privada não consegue ou não deseja estar presente; mas a principal questão aqui não é o enxugamento do Estado. O governo estadual pode ter ótimos argumentos para privatizar a Celepar, como a experiência internacional ou o fato de, mesmo no Brasil, já haver muitas empresas privadas administrando dados, como afirma a nota do governo citando “aplicativos de entrega ou de deslocamento, operadoras de cartão de crédito, redes sociais ou planos de saúde”. Mas nem o mais infalível e irrefutável dos argumentos é justificativa para que os poderes Executivo e Legislativo se esquivem da obrigação de discutir mais profundamente com a sociedade os prós e contras da privatização.
O regime de urgência imposto ao projeto de privatização da Celepar é uma manifestação de desprezo pelo debate democrático, substituído pela força de uma maioria acrítica
O “tratoraço” não faz absolutamente nada para convencer aqueles que são contrários à privatização por motivos muito legítimos, como a preocupação quanto à proteção de dados bastante sensíveis, mas poderiam mudar de ideia caso tivessem a oportunidade de participar do debate. Pelo contrário: a pressa só serve para reforçar, entre os opositores, a percepção de que há algum interesse inconfessável que pudesse vir à tona durante a tramitação do projeto, e que por isso seria preciso correr para conseguir a aprovação o quanto antes. Espanta-nos que os responsáveis pela tramitação apressada não se deem conta desse fato, preferindo conquistar logo o seu objetivo a demonstrar respeito pelo cidadão paranaense.
O regime de urgência imposto ao projeto de privatização da Celepar, portanto, é uma manifestação de desprezo pelo debate democrático, substituído pela força de uma maioria acrítica. A sociedade simplesmente não terá como discutir o projeto – nem para criticá-lo, nem para expor suas preocupações, nem para sugerir possíveis melhorias, já que uma única audiência privada, realizada nesta segunda-feira, dia 11, não é suficiente para uma discussão aprofundada. Nem mesmo os representantes do povo na Assembleia terão a chance de fazê-lo, já que é impossível analisar em oito dias todas as implicações de uma mudança tão drástica.
A inconveniência completa do “tratoraço” era algo que o governo estadual e sua maioria na Alep deveriam ter aprendido no fim de 2022, quando a Alep aprovou a privatização da Copel e de algumas medidas tributárias de forma ainda mais acelerada, pegando de surpresa todos os envolvidos, muitos dos quais nem sequer foram consultados. No entanto, o que nos parece é que a única lição tirada daquele episódio foi o de que os deputados não se incomodam com o papel de meros carimbadores daquilo que venha do Palácio Iguaçu, abrindo mão do debate, do diálogo, do esclarecimento, da informação, obrigações graves de quem ganhou nas urnas o mandato para representar a população.