A suspicácia em relação à economia brasileira está em subida, apesar do potente prolongamento registrado no ano pretérito. Um dos indicadores dessa situação é a significativa fuga de dólares: US$ 15,9 bilhões deixaram o país em 2024, segundo o Banco Meão, marcando a terceira maior retirada desde o início da série histórica em 2008. Na B3, a bolsa brasileira, foram retirados R$ 32,1 bilhões.
Os problemas não param por aí. A falta de crédito no horizonte também é evidente entre os empresários. “Por um lado, os empresários relatam uma demanda aquecida, refletindo o ritmo favorável da economia. Por outro, a piora nas expectativas sugere que 2025 será mais desafiador. O cenário macroeconômico, com aumento dos juros, dólar em alta e incertezas fiscais, contribui para a cautela dos empresários”, avalia Rodolpho Tobler, economista do Instituto Brasílio de Economia da Instalação Getulio Vargas (FGV Ibre).
O cenário é mais multíplice nos serviços, onde somente 23% das empresas registraram subida na crédito em dezembro, e no negócio, com 33%.
Na indústria, o número de segmentos sem crédito é o maior desde maio de 2023, segundo a Confederação Vernáculo da Indústria (CNI). As expectativas para demanda, compra de insumos e número de empregados em 2025 estão mais moderadas, com exceção do segmento de exportação, que mostra otimismo.
Falta de compromisso fiscal do governo alimenta suspicácia na economia brasileira
Analistas apontam que a baixa crédito é motivada pela falta de compromisso do governo em manter o estabilidade fiscal. Segundo o Banco Meão, em novembro completou-se um ano e meio de déficit primitivo do setor público consolidado.
O problema foi agravado pelo tímido pacote de controle de gastos, divulgado com delongado pelo ministro da Herdade, Fernando Haddad, e que ficou aquém das expectativas. Isso resultou na potente desvalorização do real frente ao dólar, que encerrou 2024 cotado a R$ 6,18, uma desvalorização de 27%, a maior entre as economias emergentes.
“O governo perdeu credibilidade na política fiscal, afetando a confiança dos investidores”, destaca Gabriel Fongaro, economista sênior do banco Julius Baer Brasil. O cenário deve se refletir em inflação maior, juros mais elevados e prolongamento econômico reduzido. As expectativas para o IPCA indicam um segundo ano sucessivo de estouro do teto da meta, com 11 semanas de subida, segundo o boletim Focus do BC.
“As expectativas para a inflação futura continuam sendo um dos principais desafios”, diz Igor Cadilhac, economista da PicPay. O cenário problemático deve exigir, pelo menos, mais duas altas de um ponto percentual nas próximas reuniões do Recomendação de Política Monetária do BC (Copom), agora com maioria de integrantes nomeados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O ponto médio das expectativas do mercado financeiro para os juros no final deste ano está em 14,75% ao ano. O Itaú projeta um cenário pior, com a Selic chegando a 15%, devido à piora das expectativas de inflação, câmbio depreciado e atividade econômica resiliente.
Economistas da XP Investimentos, Luiza Pineze e Alexandre Maluf, afirmam que a deterioração das expectativas inflacionárias exige um ajuste mais expediente do Copom. O principal impacto deve ser a redução do prolongamento econômico. Pela primeira vez em quatro anos, o prolongamento do PIB deve permanecer aquém de 3%, com previsão de expansão de 2%, segundo o boletim Focus. “Um crescimento de 3% do PIB é insustentável para este ano”, diz Fongaro.
“Crescer pelo consumo não é um problema, mas depender disso todos os anos é. Precisamos de um ambiente de negócios mais estável para aumentar investimentos públicos e privados”, afirma Tobler.
Cenário extrínseco também é um complicador
O cenário extrínseco também influencia negativamente. Donald Trump, presidente eleito dos Estados Unidos, prometeu endurecer políticas comerciais, o que pode fortalecer ainda mais o dólar. No final de novembro, Trump ameaçou infligir tarifas de 100% sobre países do BRICS se adotarem uma novidade moeda para substituir o dólar nas transações comerciais. Aliás, os mercados financeiros das economias emergentes têm desempenho subalterno ao de nações desenvolvidas, que atraem mais investimentos devido à rentabilidade de seus ativos.
Nos últimos 11 anos, o índice MSCI EM superou o S&P 500 somente em 2017. As ações nos EUA tiveram rendimento 10 vezes superior (430%) ao de países emergentes, segundo a Bloomberg. Em 2024, exceto Malásia e Hong Kong, as principais moedas emergentes se desvalorizaram, com nove delas caindo mais de 10%.