Dados do IBGE e da Companhia Pátrio de Fornecimento (Conab) apontam que a safra totalidade de cereais, leguminosas e oleaginosas em grãos em 2025 deve somar 322,6 milhões de toneladas em todo o Brasil. O número representa uma subida de 10,2% em relação a 2024, com 29,9 milhões de toneladas de grãos a mais.
A boa novidade do aumento na produtividade, porém, vem acompanhada de um problema que se renova: o déficit na infraestrutura de armazenamento segue sendo um dos piores gargalos para o agronegócio brasílico. Para o presidente do Parecer Superior do Agronegócio da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Jacyr Costa, a diferença entre o que será colhido e o que poderá ser armazenado pode chegar a 140 milhões de toneladas.
“O déficit deve piorar por um bom motivo, que é essa previsão de mais uma supersafra. Infelizmente a nossa infraestrutura de armazenamento não consegue acompanhar esse avanço na produção. Serão 140 milhões de toneladas de grãos que não vão para a estocagem correta e vão certamente representar perdas para o agronegócio”, avaliou Costa, em entrevista à Jornal do Povo.
Déficit de armazenamento deixa produtores com poucas alternativas
Confira:
Para o integrante da Fiesp, nesses casos o produtor tem poucas alternativas e acaba tendo que ou exportar a produção imediatamente ou direcionar a colheita para a indústria ou para as cooperativas. Por conta da grande oferta de grãos, impulsionada pelo progresso da colheita, o preço pago para esse produtor fica inferior do que ele poderia obter se houvesse uma infraestrutura adequada para vigiar a colheita.
“A falta de armazenagem não deixa que o produtor aguarde as melhores oportunidades para comercialização de seus produtos e não permite um fornecimento uniforme de alimentos ao longo do ano. Ou é isso ou é o cenário que vimos em anos anteriores, de estocagem a céu aberto. Isso é uma catástrofe porque potencializa as perdas para esse produtor”, completou Costa.
Se a previsão dele se confirmar, novamente o Brasil terá uma “Argentina” inteira em grãos sem sítio adequado de armazenamento. Dados do Parecer Agroindustrial Prateado (CAA), que reúne mais de 60 câmaras de diferentes setores do agronegócio no país vizinho, mostram que o país trabalha com a estimativa de safra 2024/2025 de 131,7 milhões de toneladas – o melhor resultado nos últimos anos.
Paulo Bertolini, presidente da Câmara Setorial de Armazenagem de Grãos da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), é mais conservador, e estimou à Jornal do Povo que o déficit entre o que será colhido e a capacidade de armazenamento no Brasil fique entre 120 milhões de toneladas e 125 milhões de toneladas em 2025.
Bertolini defendeu uma mudança de postura na cultura do agronegócio brasílico uma vez que uma verosímil solução para leste problema. Para ele, seria necessário um incentivo do governo para que os produtores rurais construíssem seus próprios silos, dentro das propriedades.
Programa de construção de silos e armazéns desestimula agricultores
Um desses incentivos, detalhou, poderia vir por meio do Programa para Construção e Ampliação de Armazéns (PCA) do BNDES. O programa oferece R$ 50 milhões para linhas de financiamento de construção de silos e armazéns. Ao aderir ao programa, o produtor rústico ter um prazo de carência de dois anos, e pode quitar o financiamento em até 10 anos. Na prática, porém, esta é uma verba que se torna escassa para os produtores rurais, uma vez que explicou o representante da Abimaq.
“Há um histórico de contingenciamento financeiro por parte do governo. Isso faz com que o produtor se desestimule. Quando ele decide fazer o investimento, pode ser tarde. O PCA está junto com o Plano Safra, a partir de julho. Até ser operacional, pode adiar para agosto. Quando esse agricultor vai levantar a documentação, e isso pode demorar um tempo, as linhas de financiamento ou já se esgotaram ou foram contingenciadas”, comentou.
De negócio com o presidente da Câmara Setorial de Armazenagem de Grãos da Abimaq, ter o armazenamento da safra dentro da propriedade rústico ajudaria a desafogar indústrias e cooperativas desta obrigação, um tanto generalidade no cenário do agronegócio pátrio. Para Bertolini, esta medida poderia baratear os custos de várias cadeias produtivas.
“O negócio de uma fábrica é fabricar, não é armazenar. Só que as indústrias se veem obrigadas a construírem grandes armazéns. Com isso, recursos que poderiam ser utilizados na ampliação da planta ou na modernização de máquinas e processos vão para a construção de silos cada vez maiores. E isso gera prejuízos e cria um círculo vicioso de perdas”, argumentou.
Mesmo com safra recorde, agricultores do Paraná não teriam perfil para bancar “silo próprio”
Salatiel Turra, crítico de Desenvolvimento Técnico do Sistema Ocepar – que representa as cooperativas paranaenses, avalia que o investimento para invadir o “silo próprio” é muito supino e não se justificaria para a maioria dos agricultores do estado. “A cada 10 cooperados no Paraná, 9 têm até 100 hectares de área de produção. São pequenos produtores, que não suportariam um investimento deste porte”, avaliou.
Turra regionalizou os dados do déficit e, de negócio com as contas do crítico, o Paraná terá, ao término da safra 2025, um tanto em torno de 14 milhões de toneladas de grãos sem espaço para armazenamento. O estado conta com uma capacidade estática de armazenamento de murado de 31 milhões de toneladas, contra uma safra prevista para mais de 45 milhões de toneladas de grãos – mais da metade corresponde à safra de soja.
As cifras mostram um propagação de 20% em relação à safra anterior no Paraná. Se as expectativas se confirmarem, o estado se consolidará uma vez que o de maior aumento relativo entre Sul e Sudeste. De negócio com o IBGE, São Paulo aparece em segundo lugar entre estados dessas regiões, com expansão projetada de 17,9% em 2025, seguido por Rio Grande do Sul (16,2%), Minas Gerais (7,0%), Santa Catarina (4,6%) e Rio de Janeiro (2,1%).
Tecnologia de monitoramento pode ajudar na conservação dos grãos
Em anos anteriores, as cooperativas e as agroindústrias precisaram recorrer a estratégias alternativas. “Nós aproveitamos o escoamento da safra para armazenar em caminhões que estavam indo para o porto. Além dos caminhões, houve casos em que foram utilizados aqueles silos-bolsa, que são estendidos no chão da propriedade. São alternativas que precisam ser criadas em cenários de adversidade”, explicou.
Uma vez que a safra precise ser armazenada em espaços alternativos, cabe ao responsável pelo armazenamento prometer a qualidade dos grãos. Uma das formas é monitorar os níveis de umidade no sítio de armazenamento. Segundo o engenheiro agrônomo Roney Smolareck, leste é um dos principais indicativos para minimizar as perdas na safra.
“Depois que esse grão entra no armazenamento, não há nada que eu possa fazer para que ele melhore a qualidade. Na prática, o trabalho é fazer com que ele não piore. Se eu negociei 100 toneladas, mas por causa da falta de controle na expedição a carga tiver perdido peso, quem vai pagar essa quebra? Esse produto de menor qualidade vai acabar chegando às nossas mesas, por isso é preciso ter todo esse cuidado”, completou.