No final do ano pretérito, a logo desconhecida Jeniffer Castro se recusou a ceder o seu lugar ao lado da janela do avião para uma rapaz, a pedido da mãe. Diante do não, foi acusada de “falta de empatia”. Em meio ao burburinho, alguém achou por muito filmar a “abominável” atitude da jovem, que se manteve serena diante da birra do menino – e da mãe. A guardiã da moralidade achou necessário gravar o vestuário, porquê uma espécie de pena: ela precisa ser cancelada por não fazer o que consideramos correto. “Estou gravando na sua cara, porque você não tem empatia pelas pessoas. Isso é repugnante”, diz a voz de quem filmou.
Esse tino em querer impor suas verdades (considerando só as suas), acreditando proteger os indefesos, mas justamente fazendo o que condena, é típico do exposição e da agenda “woke”. A vocábulo em português significa “acordado”. O termo surgiu há alguns anos, numa premissa de proteger o politicamente correto e as injustiças sociais. Foi ganhando força à medida que as pessoas repensaram questões sobre racismo, desigualdades e outros tipos de preconceito. Virou agenda, cultura. Houve avanços – no início. Mas a turma perdeu a mão na ração e exagerou. Principalmente porque prega o que não faz.
Em outros tempos, expressar não para uma rapaz que faz birra era a coisa mais normal do mundo. Mas, de uns tempos para cá, na agenda woke, isso é considerado falta de empatia. Porque, na verdade, a agenda woke é uma grande hipocrisia
Você tem que ter empatia com os outros, mas, se foi você quem errou, aí a história é outra… Os discursos de falta de empatia e de querer promover o linchamento virtual sob o argumento de que alguém errou são muito característicos dessa cultura. Mas parece que quem vem despertando é a sociedade. Para surpresa daqueles que acusaram Jeniffer – a “moça do avião” ou “mulher da janela”, porquê ficou conhecida –, de falta de empatia e a gravaram para “pagar pelo que fez”, o vídeo teve um plot twist incrível.
Jeniffer ficou famosa do dia para a noite, acumula 2,5 milhões de seguidores no Instagram e está ganhando verba com publicidade. À mãe do menino que fez birra e à pessoa que julgou e condenou com uma câmera na mão, restou a vergonha. A história rendeu memes, textões e tudo o mais que se possa imaginar para surfar a vaga do momento. A internet é assim. Cada dia surge um ponto, e várias pessoas, influenciadores ou não, discorrem sobre o tema (inclusive eu).
Apesar de toda a repercussão, vi várias vezes a mesma incerteza sobre o caso: por que a “moça do avião” ganhou tanta repercussão, a ponto de ter mais seguidores que alguns artistas que estão há anos na estrada? Uns dizem que é a urgência do brasílico em produzir um herói. Outros afirmam que as pessoas estão desocupadas e viciadas em internet. Ou, ainda, que a história é uma forma de fugir da verdade cruel econômica e política que passamos.
Mas será que esta reação exagerada em prol de Jeniffer não dá sinais de que as pessoas estão cansadas desse exposição plano, incoerente e intolerante, típico do pensamento woke? A agenda woke, que era para proteger grupos marginalizados, vem gradualmente se tornando uma mordaça. Qualquer fala, gesto ou postura fora da agenda deles passou a ser visto porquê inverídico, obsceno e até “repugnante”. De repente, o evidente virou inverídico e o inverídico, evidente. E aquele grupo que um dia levantou bandeira pela liberdade se tornou ditador de pensamentos e ações – e com uma severidade assustadora.
Em outros tempos, expressar não para uma rapaz que faz birra era a coisa mais normal do mundo. Mas, de uns tempos para cá, na agenda woke, isso é considerado falta de empatia. Porque, na verdade, a agenda woke é uma grande hipocrisia: faça o que eu digo, mas não o que eu faço.
É nessa risco que o grupo cospe regras que eles mesmos condenam, porquê, por exemplo, gravar uma pessoa sem autorização dela porque ela está “errada” em não ter empatia quando nem quem causou a confusão, nem quem gravou, tiveram empatia, saudação e noção. Onde ficou a empatia da mãe? E a ensino do garoto? Crianças não são minideuses que precisam estar alheias às frustrações e nãos. Aliás, mourejar com isso desde pequeno é importante e vai poupar anos de terapia delas e de quem tiver que conviver com adultos mimados que não aceitam negativas.
Tentaram cancelar a “moça do avião” sem dó por “falta de empatia” e gravaram para ela ser “cancelada”. Mas a reação exacerbada de esteio à Jeniffer e sua reputação repentina dá sinais de que as pessoas não aceitam mais esses discursos vazios, hipócritas e “politicamente corretos”. Oriente é somente um dos casos recentes que demonstram que o “woke” agora é outro: a sociedade é quem acordou e não vai mais engolir a intolerância e a inversão de valores que a amordaçou nos últimos anos.
Raphaela Ribas, jornalista com especialização em Marketing na Austrália, é repórter nas áreas de economia e pujança na Publicação do Povo. É uma das Top 10 jornalistas +Premiados de 2023 (Jornalistas & Cia).