Há pouco mais de uma semana, o apagão de energia ocorrido na cidade de São Paulo, devido a uma forte tempestade que assolou o município, foi notícia no Brasil e no mundo, tendo afetado mais de 2 milhões de residências, incluindo comércios e hospitais, causando significativos prejuízos nos mais variados aspectos, sobretudo diante do tempo que perdurou a crise de falta de luz.
Devido a isso, diante do complexo sistema de concessão envolvendo o serviço público de fornecimento de energia elétrica, muitas dúvidas em relação ao apagão surgiram acerca da responsabilidade civil da empresa italiana Enel, distribuidora de eletricidade na cidade desde o ano de 2018.
Vale dizer que, no âmbito administrativo, as concessionárias de energia são fiscalizadas, em nível nacional, pela Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), autarquia ligada ao Ministério de Minas e Energia, além da Arsesp (Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo),no âmbito estadual, incumbindo-lhes o controle do contrato de concessão celebrado e eventual aplicação de penalidade no caso de seu descumprimento.
Não obstante, em relação especificamente ao fatídico apagão, a concessionária Enel possui responsabilidade civil direta pela falta de luz verificada, por mais que não haja, no contrato de concessão celebrado, prazo para restabelecimento da energia condizente, situação completamente distinta da verificada quanto ao restabelecimento em caso de corte por falta de pagamento, onde, neste, há o prazo de até 24 horas em regiões urbanas e 48 horas em áreas rurais (Resolução Normativa 414/2010 da Aneel).
O direito à indenização pode incluir, inclusive, perdas materiais, como a queima de aparelhos eletrodomésticos ou de produtos perecíveis, bem como danos morais
Outrossim, o artigo 37 da Constituição Federal é uníssono ao estabelecer que as empresas prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa, de modo que o artigo 175, inciso IV, do mesmo diploma constitucional preceitua que tal serviço deve ser prestado de forma adequada, satisfatória.
Justamente em decorrência disso, a Lei 8.987/1995 – que dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos – reforça tal obrigação, impondo, em seu artigo 6º, a prestação de um serviço adequado – por parte da empresa concessionária – ao pleno atendimento das expectativas mínimas de seus usuários.
O Código de Defesa do Consumidor, por sua vez, consigna a responsabilidade objetiva dos fornecedores/prestadores de serviços em seu artigo 14, obrigando os Órgãos Públicos, concessionárias ou permissionárias, a fornecer um serviço hábil, seguro e contínuo, sob pena de responsabilidade.
Isto quer dizer que, diante da omissão ou mesmo do comportamento imperito por parte da empresa concessionária face à ausência ou falha na prestação do serviço contratado, amparado na responsabilidade objetiva aqui trazida, basta ao consumidor comprovar o dano ocorrido, indicando o prejuízo sofrido e o nexo de causalidade do mesmo para com a conduta da empresa distribuidora de energia, independentemente se a mesma agiu com culpa negligência na situação ocorrida.
O direito à indenização pode incluir, inclusive, perdas materiais, como a queima de aparelhos eletrodomésticos ou de produtos perecíveis, bem como danos morais, advindos do desconforto, transtornos variados e insegurança que a falha na prestação do serviço gerou ao consumidor.
Nesta esteira, em razão da desídia gerada pelo apagão, defeituoso fornecimento de energia elétrica, o consumidor cidadão poderá procurar o Procon de sua região, sem prejuízo de acionar o Juizado Especial Cível competente, acompanhado preferencialmente de um profissional de sua confiança, visando assegurar a reparação ampla e integral dos danos de toda ordem sofridos.
Lucas Nowill de Azevedo é advogado.
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