Com a aprovação da reforma tributária pelo Congresso, profissionais liberais dos mais diversos setores precisam se adequar às novas regras. Segundo cálculos e avaliações de analistas consultados pela Publicação do Povo, até mesmo os profissionais das categorias que terão recta a redução da alíquota-base do novo IVA terão uma subida significativa na tributação em confrontação ao que pagam hoje.
Atualmente, os profissionais liberais que atuam uma vez que pessoa jurídica podem optar por três regimes de tributação: o Simples Vernáculo (para quem tem receitas de até R$ 4,8 milhões); o regime de lucro presumido (faturamento entre R$ 4,8 milhões e R$ 78 milhões); ou o regime de lucro real (mais de R$ 78 milhões).
No regime do Simples, a trouxa tributária varia de 6% a 33% do faturamento do profissional liberal. A reforma tributária não trouxe modificações para a cobrança de impostos dessa categoria, segundo o professor de Gestão Tributária Helder Santos, da Fipecafi.
Atualmente, pelo regime de lucro presumido, o profissional boceta com uma média de 14,53% em tributos federais (sendo 3% de PIS e 0,65% de COFINS, mais 8% de Imposto de Renda sobre a Pessoa Jurídica, IRPJ, e 2,88% de Imposto Social sobre Lucro Líquido, CSLL).
A esse porcentual, soma-se o Imposto sobre Serviços (ISS), que pode variar de 2% a 5%. Ou seja, no totalidade, os impostos podem chegar a 19,53%, segundo João Eloi Olenike, presidente-executivo do Instituto Brasílio de Planejamento e Tributação (IBPT).
Com a implementação da reforma tributária, PIS e Cofins serão substituídos pela Imposto sobre Bens e Serviços (CBS), que é um tributo federalista. Já o ISS será substituído pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que unifica tarifas estaduais e municipais. Juntos, CBS e IBS formarão o chamado IVA (imposto sobre valor confederado).
Os profissionais que hoje optam pelo lucro presumido arcam com, no supremo, 8,53% de PIS, Cofins e ISS. Com a reforma tributária, a soma de IBS + CBS chegará a 26,5%, se considerada a alíquota universal máxima do IVA estipulada pelo Congresso. Acrescidas as cargas tributárias do IRPJ e da CSLL (10,88%), o tributo final pode chegar a 37,38%.
No lucro real, as atuais tarifas de PIS e Cofins vão para 1,65% e 7,6%. Ou por outra, a CSLL e o IRPF também são mais altos, 9% e 15% respectivamente. No entanto, o sistema de lucro real prevê taxas extras de imposto de renda de 10% para lucro excedente a R$ 20 milénio por mês.
Apesar das alíquotas mais altas, o sistema de lucro real possibilita o dedução de créditos. Sem contabilizar créditos, somando-se os 26,5% do IVA, aos 9% de CSLL e 15% de IRPF, chega-se à alíquota de 50,5%, até R$ 20 milénio de lucro, e de 45,5% para o lucro excedente a esse valor.
Olenike ressalta que alterações poderão ser propostas no porvir sobre a renda e o patrimônio, afetando as alíquotas do IRPJ e da CSLL. “Se continuar como está hoje, além do IVA teríamos o Imposto de Renda e a Contribuição sobre o Lucro, cobrados de acordo com a forma de trabalho do profissional liberal [PF ou PJ] e pelo regime fiscal escolhido para sua operação”, diz.
Mesmo com 30% e 60% de desconto, profissionais terão taxação maior
A reforma tributária traz a possibilidade de desconto para alguns profissionais liberais. No caso de profissões de natureza científica, literária ou artística, o desconto será de 30% sobre o IVA padrão, incluindo economistas, profissionais da instrução física, veterinários e profissionais de relações públicas, entre outros.
Para essas categorias, a alíquota totalidade será de 29,43% (18,55% de IVA menos 30% de 26,5%, acrescidos de 10,88% de IRPJ e CSLL). Um aumento de praticamente dez pontos percentuais em relação ao que é retraído hoje dos profissionais liberais no regime do lucro presumido.
No caso de médicos e outros profissionais de saúde, o desconto será de 60%, fazendo com que a alíquota final seja de 21,48% – ou seja, muro de dois pontos percentuais supra da que hoje incide sobre essas profissões.
Sistema de créditos pode encarecer serviços de profissionais liberais para pessoas físicas
Um dos pontos da reforma tributária que pode inspirar no preço final dos serviços de profissionais liberais é o sistema de créditos. Assim, quando um profissional presta serviços para uma empresa, os tributos incidentes sobre esses serviços podem ser aproveitados uma vez que crédito pela pessoa jurídica contratante.
Essa dinâmica permite que a empresa abata esses valores de seus impostos a remunerar, o que reduz o dispêndio efetivo da contratação do serviço, conforme explica Charles Gularte, vice-presidente executivo da Contabilizei. No entanto, isso não ocorre quando um profissional presta serviço para uma pessoa física.
Nesse caso, não está prevista a possibilidade de aproveitamento de créditos tributários. Isso ocorre porque pessoas físicas não são contribuintes no sistema de tributação de consumo, e, portanto, não têm débitos tributários a serem compensados com créditos.
Segundo Gularte, essa diferença é mormente relevante para profissionais liberais que atendem majoritariamente pessoas físicas, uma vez que advogados, médicos e outros prestadores de serviços.
“Nesse cenário, eles podem enfrentar desafios no repasse de custos ao cliente final, tornando essencial avaliar o impacto da tributação sobre o preço dos serviços”, diz.
De concórdia com João Olenike, essa questão pode influenciar o dispêndio final para o cliente pessoa física e tornar os serviços menos competitivos no comparativo com empresas.
Subida de impostos pode preconizar informalidade
A implementação das novas regras e da regulamentação da reforma tributária levará oito anos até ser concluída, conforme destaca Olenike. Até lá, ele relembra que pode possuir alterações que amenizem a subida de impostos para os profissionais liberais.
Mesmo assim, o presidente-executivo do IBPT ressalta que “quando há carga tributária muito alta e difícil de se cumprir, existem aumentos nos casos de informalidade, como já temos, em vários exemplos, em nosso país”.
O professor Helder Santos, da Fipecafi, destaca que o aumento da trouxa tributária é um fator importante para prescrever o comportamento dos empresários. Há um ponto ótimo de taxação que maximiza a arrecadação do governo.
Se a alíquota é muito baixa, a receita é pequena e insuficiente. Se, por outro lado, o tributo for muito cimeira, a receita também pode diminuir porque estimula indivíduos e empresas a reduzir suas atividades econômicas declaradas, levando à sonegação ou mesmo à fuga para outras jurisdições com menores taxas.
“Outro paisagem importante é o veste de que a subida trouxa tributária poderá desincentivar novos investimentos, afastando a atração de capitais nacionais e internacionais. Uma das principais reflexões produzidas pelo debate sobre esse efeito da tributação é de que reduzir as alíquotas pode estimular a atividade econômica e, paradoxalmente, aumentar a arrecadação do governo”, explica o professor.