Criado pela deputada federal Luísa Canziani (PSD/PR) e outros nove parlamentares de partidos de esquerda, de centro e de direita, o Projeto de Lei 5.669/2023 pode, segundo críticos, levar às escolas mais insegurança jurídica e física, a pretexto de torná-las mais seguras. A proposta tramita em regime de urgência na Câmara dos Deputados.
Se aprovada, a lei criaria a Política de Prevenção e Combate à Violência em Âmbito Escolar (Prever), destinada a enfrentar diversas formas de violência física, psicológica e moral nas escolas, inclusive o bullying e o Cyberbulling (deboches e constrangimentos entre alunos na internet), além de ofensas de caráter “sexual: conduta que configure constrangimento, ameaça ou outro ato com dano, prejuízo ou anulação do exercício dos direitos sexuais”, diz a alínea d do inciso I do Artigo 2º do projeto.
O projeto original não prevê empregar agentes das forças de segurança no policiamento ostensivo das escolas, preferindo medidas como “promover uma cultura inclusiva”, produzir “relatórios” sobre ocorrências escolares potencialmente geradoras de violência, monitorar as redes sociais dos estudantes, criar um “protocolo de avaliação de risco”, garantir uma pensão vitalícia para professores, alunos e servidores escolares em caso de “incidente com múltiplas vítimas” que gere “sequelas físicas ou psicológicas”, e “elaborar protocolos de formação”, além de outras iniciativas de “prevenção, mitigação e acompanhamento de vítimas”.
Uso de termos vagos pode favorecer medidas como trans em banheiros femininos
Um dos principais problemas do texto, de acordo com a advogada Andrea Hoffmann, especialista em relações governamentais, é o uso de termos vagos ou imprecisos, com ampla margem para interpretações subjetivas. Por exemplo, o texto não especifica se uma piada de teor pretensamente “xenofóbico” ou “homofóbico” contada por um aluno em sala de aula, por exemplo, configuraria “incidente com múltiplas vítimas”, gerando o ônus social da pensão vitalícia para todos os que alegassem “sequelas psicológicas” nesse caso.
O projeto poderia blindar também, segundo ela, sob o argumento de defesa de “direitos sexuais”, campanhas com conteúdo sexual impróprio para os alunos de idades menores, levantando o risco da sexualização precoce de crianças. O termo genérico ainda poderia servir para impor a entrada irrestrita de adolescentes autodeclarados “trans” em banheiros femininos, por exemplo, colocando em risco a segurança de meninas e vetando aos pais qualquer possibilidade de questionamento.
“Há formulações vagas e muito problemáticas no projeto que poderiam favorecer a ideologia de gênero, ferir a liberdade de expressão de estudantes e professores, além de afastar ainda mais os pais do debate sobre a salubridade do espaço escolar, sendo que eles são os protagonistas na educação dos filhos e deveriam ficar a par dessas questões também”, afirma Hoffmann.
Projeto segue visão “romantizada” ineficaz e não inclui ações que poderiam prevenir ataques em escolas
Segundo a assessoria da deputada Luísa Canziani, autora do projeto, o PL é fruto do Grupo de Trabalho Política de Combate à Violência nas Escolas Brasileiras (GT-Escola), instalado por ela na Câmara dos Deputados em 2023. Questionada se a motivação do projeto teria inspiração em algum atentado escolar específico, a assessoria respondeu apenas que ele veio “depois dos vários ataques registrados nas escolas do Brasil”, sem citar nenhum em particular que poderia ter sido evitado pelas medidas aventadas no PL 5.669/2023.
A prevenção a atentados violentos cometidos por agressores externos armados, como os que fizeram várias vítimas fatais na escola do Realengo, Rio de Janeiro, em 2011, na creche de Janaúba (MG), em 2017, ou na de Blumenau (SC), em 2023, exige medidas de segurança e policiamento, não previstas no projeto, explica Fabrício Rebelo, jurista especialista em segurança pública.
“O projeto é nitidamente inspirado em concepções principiológicas e, até mesmo, romantizadas quanto às causas reais da violência nas escolas, adotando um modelo de prevenção integrativa, mas sem prever ações concretas que deixem alunos e professores realmente mais seguros”, explica.
“A ideia parece ser apenas a de desestimular que os próprios alunos desenvolvam o intento de promover ataques às instituições de ensino, deixando de lado as medidas para que estes, se desencadeados, sejam prontamente frustrados. No histórico de ataques já registrados no Brasil, nada do que se apresenta no texto aparenta ter qualquer eficácia”, salienta.
Sobre as críticas envolvendo possíveis brechas legais para a sexualização precoce e a introdução de ideologia de gênero nas escolas, a assessoria da deputada Canziani nada respondeu. Este espaço continuará aberto para manifestações da parlamentar ou dos demais autores do projeto.
Como o projeto é tão abrangente quanto vago em suas definições e altera inclusive leis anteriores, como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), ele precisa passar, no Parlamento, pelas comissões de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado; de Saúde; de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família; de Educação, de Finanças e Tributação; e de Constituição e Justiça e de Cidadania.
Sua promulgação como lei depende da aprovação nas duas casas legislativas: a Câmara dos Deputados e o Senado. No último dia 7 de maio, o projeto foi, contudo, alvo de requerimentos dos deputados Sóstenes Cavalcante, Gilson Marques e Luciano Zucco para ser retirado de pauta.
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