Até o final deste ano, o Congresso Nacional terá a responsabilidade de definir os rumos da educação brasileira para a próxima década, por meio da aprovação de um novo Plano Nacional de Educação (PNE). Trata-se de uma oportunidade crucial para enfrentar as persistentes deficiências do sistema educacional e reduzir o abismo que separa o Brasil de nações com melhores índices de aprendizado e colocar o país no caminho da excelência. Para tanto, será necessário um esforço firme e criterioso dos parlamentares, sobretudo diante da proposta encaminhada pelo governo federal, que está longe de priorizar a melhoria da qualidade do sistema nacional de ensino.
Nascida a partir do documento aprovado durante a última Conferência Nacional de Educação (Conae), realizada no final de janeiro do ano passado, em Brasília – evento marcado pela presença maciça de grupos ligados a movimentos sindicais e sociais e pelo cerceamento de vozes discordantes –, a proposta do governo Lula para o novo PNE é falha em muitos aspectos e está longe de contribuir para a melhoria da qualidade do ensino no país, priorizando interesses corporativistas e ideológicos em vez da melhoria da qualidade educacional no país.
Caso o Congresso opte por aprovar, sem alterações profundas, um plano que negligencia a qualidade do ensino, estará não apenas desperdiçando uma oportunidade histórica, mas também condenando o país a mais uma década de estagnação
Levantamento realizado pela Confederação Nacional das Associações de Pais de Alunos (Confenapais) identificou ao menos 99 pontos críticos na proposta original para o novo PNE, muitos deles caracterizados por formulações vagas, subjetivas e desconectadas de metas concretas. Um dos aspectos mais preocupantes é a previsão de aumento substancial dos investimentos públicos em educação – com a meta de alcançar 10% do PIB – sem que se apresentem critérios claros de eficácia ou mecanismos de vinculação desses recursos à melhoria da aprendizagem.
A crença de que a simples ampliação orçamentária resultará automaticamente em avanços educacionais é, no mínimo, ingênua. Gastar mais e mal não adianta – é puro desperdício de dinheiro público. Um PNE focado em melhorar a qualidade do ensino deve, necessariamente, atrelar os investimentos a ferramentas e critérios concretos para a avaliação do ensino – como os estabelecidos por avaliações internacionais de educação que medem a aprendizagem de estudantes em diversos países, como PISA, TERCE, LLECE e ERCE.
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Outra fragilidade do novo PNE reside na centralização de competências no Ministério da Educação (MEC), em detrimento da autonomia das redes de ensino e dos próprios educadores. A proposta acena para a padronização de modelos já testados e fracassados, sem reconhecer a necessidade de soluções adaptadas às diversas realidades locais; e propõe a manutenção de práticas que desestimulam a excelência, como a aprovação automática e as falhas estruturais na alfabetização – tão profundas que hoje 30% da população brasileira é formada por analfabetos funcionais, incapazes de compreender ou interpretar um texto simples.
Além disso, o documento está recheado de referências ideológicas, favorecendo o acesso a recursos e políticas públicas a determinados grupos em detrimento de outros. Em várias das estratégias propostas, por exemplo, o texto do governo menciona prioridade a estudantes “negros, indígenas, quilombolas, do campo, das águas e das florestas”, numa espécie de segregação que compromete crianças pardas e brancas que também se encontram em vulnerabilidade socioeconômica. O teor ideológico também transparece na proposta do PNE com a inclusão de temáticas alheias à educação, os chamados “temas transversais”, como educação ambiental, direitos humanos e relações étnico-raciais já na educação infantil, tirando o foco de conteúdos e competências essenciais para o desenvolvimento cognitivo e a alfabetização.
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Diante de tantas lacunas, caberá à Comissão Especial da Câmara dos Deputados crida apara debater o tema examinar a proposta do PNE com rigor e responsabilidade. Embora o projeto tramite em regime de prioridade, com expectativa de apreciação no Senado ainda neste ano, a urgência não pode servir de pretexto para uma deliberação apressada ou superficial. O futuro da educação brasileira exige um debate à altura de sua importância.
Caso o Congresso opte por aprovar, sem alterações profundas, um plano que negligencia a qualidade do ensino, estará não apenas desperdiçando uma oportunidade histórica, mas também condenando o país a mais uma década de estagnação educacional – e, por consequência, de atraso social e econômico.