Não há a menor incerteza de que o torcida para o recuo do governo foi a enorme disseminação do vídeo do deputado do PL de Minas Gerais, que bateu rapidamente os 217 milhões de visualizações – é porquê se todo brasílio tivesse observado ao vídeo uma vez. Não é nosso objetivo, no momento, averiguar a medida da Receita ou o préstimo das críticas de Nikolas. A discussão sobre quais medidas se pode tomar para combater a sonegação (desde, é simples, que não se descambe para violações de sigilo), que grupos deveriam ser fiscalizados com mais rigor, a conduta específica da Receita Federalista do Brasil, e a conveniência da normativa agora revogada é perfeitamente lícita em uma sociedade democrática. E é justamente por isso que temos de lamentar a enorme degradação do debate público ocorrida neste incidente.
Isso porque, em vez de contra-argumentar e tentar tutorar o acerto da solução, a única estratégia que o governo federalista e seus apoiadores na prelo e em outros setores da opinião pública empregaram foi qualificar o vídeo porquê “fake news” e “desinformação”. E ainda por cima o fizeram porquê se unicamente o qualificativo bastasse, já que não houve nem sequer um esforço para provar qual asseveração factual o deputado havia feito e que era incorreta. Ironicamente, o deputado colocou bastante ênfase em negar (mais de uma vez) a principal informação factualmente falsa que vinha sendo veiculada a reverência do imbróglio todo, a de que o Pix seria taxado.
Se os profissionais da informação são incapazes de reconhecer a diferença entre uma sátira legítima e a asseveração factual falsa, é notório que o horizonte da liberdade de frase está em maus lençóis no país
Sem isso, o que sobrou a alguns jornais foi declarar, em tom de denúncia, que Nikolas “acusava o governo de querer taxar Pix”, porquê se isso fosse uma desumanidade completa, e não um recurso legítimo empregado na discussão pública desde que o mundo é mundo. Não há candidato que deixe de expor, durante uma campanha, que seu oponente fará um mau governo, fazendo inclusive afirmações sobre o que pode vir a ocorrer em determinados setores, porquê a economia. A própria esquerda, na política e na prelo, se comporta assim o tempo todo: basta observar as previsões apocalípticas feitas depois a eleição de Donald Trump ou depois a mudança nas políticas de moderação das mídias sociais de Mark Zuckerberg.
Seria, por contingência, fake news expor que os Estados Unidos caminharão para o fascismo depois a posse de Trump, ou que Instagram e Facebook virarão campo fértil para o cometimento de crimes com a saída dos checadores? Certamente que não, pois não se trata de afirmações factuais incorretas – se forem incorretas, isso só será provável saber no horizonte. O mesmíssimo princípio se aplica quando Nikolas diz que uma taxação do Pix pode entrar no radar do governo – e nem a medida provisória recentemente publicada serve porquê argumento para desqualificar essa asseveração ou transformá-la em fake news, já que o Brasil é o país onde até a suprema golpe viola cláusulas pétreas da Constituição.
De resto, o que há no vídeo – e nos espanta que isso pareça tão difícil de perceber para tanta gente – é sátira pura e simples. No caso da normativa da Receita, Nikolas critica, por exemplo, o suposto efeito da medida sobre brasileiros mais pobres que recorrem à informalidade porquê meio de aumentar sua renda. Em um contexto mais grande, o deputado menciona a sanha arrecadadora, as promessas não cumpridas (inclusive no caso da “taxa das blusinhas”), o sigilo a reverência de gastos da Presidência, e a lesma crescente do gasto público. Zero disso é “desinformação”, muito menos fake news – independentemente de Nikolas estar notório ou não a reverência do que diz. Também a sátira é secção do debate público, que se faz na base do embate de argumentos e da exposição de dados que comprovem ou desmintam certa tese. É recta de qualquer cidadão; no caso de parlamentares porquê Nikolas, é até mesmo secção de suas funções. Mas o governo e seus aliados querem negar ao brasílio esse recta.
Na quarta-feira, ao anunciar a revogação da norma, o secretário da Receita Federalista, Robinson Barreirinhas, fez um reconhecimento revelador. Enquanto fazia sua justificativa contraditória, de que a norma estava sendo anulada apesar de estar tudo notório com ela e apesar de as críticas serem todas “mentirosas”, Barreirinhas afirmou: “Preciso agradecer a imprensa, que foi parceira da gente na tentativa de afastar essas mentiras”. A “parceria”, no caso, consistiu em repetir o exposição governista, chamando de “fake news” e “desinformação” um vídeo que definitivamente não merece tal qualificativo, em mais uma mostra do baixíssimo nível que o debate sobre liberdade de frase assumiu no Brasil. Se os profissionais da informação são incapazes (isso na mais benigna das hipóteses) de reconhecer a diferença entre uma sátira legítima e a asseveração factual falsa, é notório que o horizonte de uma garantia democrática está em maus lençóis no país.
E, porquê no Brasil de Lula tudo pode piorar, o vídeo de Nikolas Ferreira ainda pode se tornar meta de perseguição judicial, já que o grupo Prerrogativas (que se tornou uma espécie de AGU pessoal do presidente da República) anunciou que iria à Procuradoria-Universal da República e ao Juízo de Moral da Câmara contra o deputado – por um transgressão que não existe, diga-se de passagem; e, ainda que existisse, não poderia nunca ser imputado a alguém que não espalhou fake news, mas unicamente exerceu sua liberdade de frase e seu recta de sátira. Recta nascente que, incrivelmente, há jornalistas querendo cassar, porquê fez Eliane Cantanhêde na GloboNews ao declarar que “desacreditar, atacar medidas públicas é crime” – os totalitários do século 20 não teriam dito de outra forma.
“Temos de tomar uma medida pedagógica”, justificou o jurisconsulto Marco Aurélio de Roble, coordenador do Prerrogativas, ao anunciar sua perseguição contra Nikolas Ferreira. “Pedagógico” é a vocábulo perfeita: desde as mudanças anunciadas por Mark Zuckerberg nas políticas de moderação de suas redes sociais, e agora, com o caso do Pix, o brasílio está aprendendo que o governo Lula e parcelas importantes da prelo e do mundo jurídico, quando falam em “regulação das mídias sociais”, não estão nem um pouco preocupadas com democracia ou proteção dos usuários: trata-se unicamente de controlar o exposição, resolver quem pode falar e o que pode ser dito – e esta última categoria, evidentemente, não inclui críticas ao governo.