Com a utilização de unicamente metade do potencial de vias navegáveis, o Brasil pretende ampliar o uso de rios para transporte de cargas e passageiros investindo na licença de hidrovias. Os projetos incluem os rios Paraguai, Madeira, Barra Setentrião, Lagoa Mirim, Tapajós e Tocantins e devem correr o transporte, principalmente, de produtos agrícola e mineral, com aumento de corredores logísticos no país e redução do custos de frete, além de gerar ocupação e renda e minimizar a emissão de carbono.
Considerada a “última fronteira de investimento em infraestrutura do Brasil”, as hidrovias integram uma modalidade opção aos sistemas rodoviário e ferroviário, de transporte de passageiros e cargas por vias navegáveis de rios e lagos. Com a licença, a empresa privada parceira terá de fornecer navegabilidade e segurança dos usuários.
“Da mesma forma que a concessionária de rodovia cuida do pavimento, a de hidrovia vai ter que cuidar da dragagem, o rio precisa ter intervenções para tirar morros de areia e deixar canal de navegação com profundidade adequada”, explicou o secretário vernáculo de Hidrovias e Navegação, Dino Antunes Dias Batista, em entrevista à Jornal do Povo.
Desses seis rios, a prioridade é a licença do Rio Paraguai, de harmonia com ele. “Ela vai ser a nossa ponta de lança, prioritária”, completou o secretário. A expectativa do governo é de que a licença dessa hidrovia seja analisada em consulta pública nas próximas semanas. Outros dois projetos estão avançando e têm atenção do governo: as concessões do Rio Madeira, que banha os estados do Amazonas e Rondônia, e da Lagoa Mirim, no Rio Grande do Sul.
O rio Paraguai tem nascente no Mato Grosso, passa pelo Mato Grosso do Sul e cruza a fronteira, chegando na Bolívia, depois Paraguai e, por último, na Argentina, onde deságua no rio Paraná. Considerado um dos principais da América do Sul, o rio Paraguai é um importante galeria para integrar os países da região, para transporte de cargas e de pessoas, muito porquê para provisão de populações locais, além de impactar no ecossistema do Pantanal.
A prioridade por essa licença é devido à consolidação do transporte de cargas nessa região, explicou o secretário Batista. Outro elemento é a viabilidade da licença, que pressupõe contrapartida por secção do usuário, através de um pagamento, porquê o de pedágio nas rodovias. “A tarifa que estamos chegando é adequada, quando a gente compara com o benefício que tem no trecho”, disse ele. Questionado em quanto estaria a tarifa, o secretário respondeu que não tinha permissão para comentar e que o proclamação do valor é feito quando ocorre consulta pública.
A expectativa do diretor-geral da Escritório Vernáculo de Transportes Aquaviários (Antaq), Eduardo Nery, é que a licença do rio Paraguai beneficie os países pelos quais o rio passa, além do Uruguai, e faça “com que uma via de transporte de carga possa ser utilizada de maneira eficiente e operacional”.
O transporte aquaviário tem menor dispêndio de implementação do que o rodoviário, por exemplo, além de apresentar redução no percentual de acidentes fatais e de roubo e extravio de cargas. Entre os impactos “fundamentais” desse tipo de modal, destaca o secretário, está a redução de emissões de carbono. “O transporte aquaviário é pelo menos 80% menos poluente do que o rodoviário”, afirma.
Ainda em relação ao meio envolvente, o professor da Universidade Federalista de Santa Catarina (UFSC) Eduardo Antonio Temponi Lebre, que atua no Laboratório de Estudos em Recta Aquaviário e Ciência da Navegação, diz que os benefícios são enormes. “aqui no Brasil a gente impactou muito o meio ambiente por insistir em concentrar a logística no modal rodoviário, a gente não compartilhou com outros modais e a gente prejudicou o meio ambiente fazendo isso”.
Para ele, o Brasil subestima e subaproveita esse potencial de logística hidroviário. Apesar dos recentes anúncios do governo em relação à licença, Lebre diz que não há indícios de que qualquer governo vá volver a logística de transporte para o aquaviário. “Tem um projeto ou outro (para hidrovias), uma verba ou outra, mas não há cultura do transporte através de embarcações no Brasil”, afirma.
Licença do Rio Madeira prevê aporte do governo e redução do risco de desabastecimento
Mais longo e importante afluente do rio Amazonas, o Rio Madeira passa por Rondônia e Amazonas, no Brasil, além de Bolívia e Peru. A hidrovia, que pode ser concessionada, tem extensão de 1.075 quilômetros e é por ali que passa um terço do escoamento de soja e milho da região Setentrião do país. Com a licença à iniciativa privada, a expectativa do governo federalista é de que seja provável gerar ocupação e renda de maneira sustentável para a região.
O investimento direto estimado para os 12 anos de licença é de R$ 109 milhões e incluirá serviços de dragagem, derrocagem, balizamento e sinalização adequados, além da manutenção e operação de seis instalações portuárias públicas de pequeno porte (IP4s), para prometer segurança e confiabilidade da navegação.
Aliás, será feito um aporte ao projeto por secção do governo federalista de R$ 561,35 milhões proveniente da Eletrobras. “Esse recurso foi colocado na lei de privatização da Eletrobras, especificamente para melhoria da navegação do Rio Madeira, então já existe esse recurso. Está sendo depositado em uma conta para esse tipo. Então a gente vai utilizar”, explica o secretário. Até o momento, não há previsão de aporte do governo federalista para outras concessões de hidrovia.
A hidrovia do Rio Madeira é rota fundamental para o escoamento da produção de grãos dos estados do Mato Grosso e de Rondônia, e para o deslocamento de passageiros na região. Pelo projeto de licença, a hidrovia vai movimentar principalmente soja, milho, granéis líquidos, combustíveis, veículos, fertilizantes, contêineres e outras cargas gerais.
A expectativa do governo federalista é de que a licença evite o desabastecimento de combustíveis e reduza a quase zero o risco de desabastecimento de produtos em Rondônia, já que a hidrovia é responsável pelo transporte desses insumos para o estado.
Aliás, com investimentos em manutenção, será provável transportar trouxa por mais tempo, inclusive no período da seca, e receber embarcações maiores e com mais cargas. Com esse proveito de eficiência, a Escritório Vernáculo de Transportes Aquaviários (Antaq) estima redução do dispêndio das empresas de navegação em torno de 24%, frente a uma tarifa de menos de um real por tonelada – a previsão pré-leilão é de que fique em R$ 0,80. Uma vez que o critério de licitação será menor tarifa, esse valor poderá ser reduzido.
O projeto de licença estabeleceu que o transporte de passageiros e pequenas embarcações serão gratuitos no Rio Madeira e somente será feita a cobrança de tarifa para a movimentação de cargas quando a concessionária principiar a prestar o serviço.
Licença da Lagoa Mirim viabiliza transporte, diz secretário
A Lagoa Mirim é um corpo hídrico localizado na fronteira entre o Rio Grande do Sul e o Uruguai. Atualmente, a profundidade do meato de navegação não é suficiente para prometer o tráfico seguro de embarcações durante todo o ano – a lagoa não possui registros de navegação mercantil, segundo o Projecto de Outorgas do governo federalista. Por isso, o projeto de licença propõe o aprofundamento e a manutenção do meato de navegação, garantindo o tráfico seguro de embarcações de modo permanente.
“O empreendimento irá melhorar a segurança, a confiabilidade e a eficiência do transporte hidroviário, com consequente mitigação dos passivos ambientais gerados por uma operação inadequada”, diz o governo federalista.
Segundo o secretário vernáculo de Hidrovias e Navegação, foi feita uma conferência entre o transporte hidroviário e rodoviário na região, para entender a viabilidade do projeto. “A gente está conseguindo ficar com valor 70% mais baixo do que o rodoviário”, diz.
Aliás, ele explica que, dissemelhante de outros rios, a hidrovia da Lagoa Mirim incluirá trecho que no sistema rodoviário é tão custoso que nem é realizado o transporte. “Não é nem que você está barateando frete, é que está viabilizando transporte”, afirma.
São Paulo aposta em hidrovias para reduzir trânsito
Apurar o uso de rios e lagos para transporte, principalmente de passageiros, também tem sido preocupação de governos municipais. A prefeitura de São Paulo, por exemplo, elaborou um novo projecto hidroviário para a cidade, que procura ressignificar a relação da maior cidade da América Latina com as águas, reduzindo o trânsito e a poluição.
O projeto, que prevê usar os 180 quilômetros de hidrovias da capital, está em tempo de consulta pública. Os moradores têm até 22 de dezembro para participar. Conforme a prefeitura, o projeto inclui o transporte pelos rios Pinheiros, Tietê e Tamanduateí, além de represas Billings Guarapiranga, e córregos, porquê Meninos e Couros.
Projecto hidroviário de São Paulo pretende ressignificar a relação da maior cidade da América Latina com as águas, reduzindo trânsito e poluição.
A ideia da prefeitura é que São Paulo tenha um meio de transporte similar ao Aquático SP, que atua na zona sul da cidade e transporta 1,3 milénio passageiros por dia. O projecto inclui ecoportos, ecoparques, marinas, estaleiros e instalação de eclusas nas barragens para fazer essa passagem de um nível para o outro nos rios e nas represas.
O projeto teve a participação de 18 órgãos, de diversos setores e especialidades técnicas, que formaram o Grupo de Trabalho Intersecretarial e de Convênios de Cooperação Técnica e Científica. Entre os objetivos do projecto, a prefeitura destaca:
- Orientar o desenvolvimento urbano sustentável a partir da integração da cidade e suas águas
- Conduzir a transformação das Orlas Fluviais pela Navegação Fluvial Urbana
- Integrar projetos setoriais a partir das águas para preparar a cidade para o contexto das mudanças climáticas
- Maximizar os benefícios sociais e econômicos das novas infraestruturas urbanas fluviais.