Uma pesquisa obtida pela BBC News Brasil nesta quinta-feira, 6, mostra uma queda na quantidade de refeições feitas fora de casa e um esforço maior para economizar com comida no supermercado, especialmente entre as famílias de menor renda.
“É por isso que chamamos esse consumidor de ‘equilibrista’, porque entende que ele está fazendo escolhas com o objetivo de balancear os gastos”, considera Pedro Soares, diretor de contas da divisão Worldpanel da Kantar.
O estudo monitora os hábitos de consumo de 11,3 mil lares em todas as regiões e classes sociais do Brasil. Os dados são coletados a partir das notas fiscais de todas as compras realizadas pelas famílias, desde supermercados até pequenos comércios de bairro, além de bares, restaurantes e lanchonetes.
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O ritmo de desaceleração acompanha o aumento da inflação de alimentos e bebidas no período. No último ano, os preços desse setor subiram, em média, 7,69%, quase o dobro da inflação geral medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que fechou em 4,83%.
As refeições dentro de casa foram as que mais encareceram, com uma alta média de 8,23%. Já o custo da comida fora do lar subiu um pouco menos, mas ainda acima da inflação geral, com um avanço de 6,29%, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Com a alta nos preços e o aumento do custo de vida, os brasileiros passaram a reavaliar seus hábitos de consumo. Esse freio nos gastos foi mais perceptível entre as classes D e E, que sentiram de forma mais intensa o impacto da inflação.
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Os primeiros sinais de desaceleração começaram a surgir nos últimos meses de 2024. A primeira indicação dessa mudança foi a redução no ritmo de crescimento das refeições fora de casa. No último trimestre, a frequência desse hábito aumentou 4,1%, um avanço bem menor do que os 9% registrados ao longo do ano.
Outra mudança perceptível ocorreu dentro dos supermercados. Conforme o fim do ano se aproximava, os carrinhos se esvaziaram e os consumidores passaram a visitar o comércio com mais frequência. No último trimestre, a frequência das idas ao supermercado aumentou 8% em relação ao mesmo período de 2023, mas o valor médio gasto por visita caiu 0,4%.
Pobres são os mais afetados pela crise
A pesquisa mostra que os mais pobres foram os que mais sentiram a crise econômica no fim de 2024. As classes D e F foram o único grupo em que a frequência de consumo em lanchonetes e restaurantes recuou no último trimestre de 2024: expressivos 10% em relação ao mesmo período do ano anterior.
No supermercado, essas classes foram o único grupo que reduziu o total de unidades que colocou no carrinho (-0,6%) e ampliou o gasto médio por domicílio em menor ritmo, 4,3%, quase metade do registrado entre os demais.

A queda na aprovação do governo registrada nas pesquisas de opinião foi mais acentuada entre essa parcela da população. Segundo o Datafolha, a avaliação positiva da gestão entre brasileiros com renda inferior a dois salários mínimos caiu de 49% para 29% entre dezembro e fevereiro.
Como ressalta a consultoria de análise política Eurasia Group, esse grupo, junto com as mulheres — cuja aprovação ao governo recuou de 38% para 24% —, é um dos mais afetados pela alta na inflação de alimentos, já que costuma destinar uma parcela maior da renda para a compra de produtos básicos.
Um levantamento da Fundação Getúlio Vargas (FGV) revelou que, em janeiro de 2025, 22,61% do orçamento das famílias com renda entre 1 e 1,5 salário mínimo foi destinado à compra de alimentos, contra 18,44% no mesmo período de 2018.
Comida mais cara enfraquece governo Lula
O cenário se reflete na queda de popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A questão econômica, especialmente a alta nos preços da comida, é considerada como um dos principais fatores para a impopularidade do governo. “É o calcanhar de Aquiles de Lula”, afirmou Christopher Garman, da Eurasia Group.
A análise se baseia na pesquisa mais recente do Datafolhadivulgada em fevereiro, que mostrou uma queda na aprovação do governo Lula. O porcentual de entrevistados que consideravam a gestão “ruim” ou “péssima” subiu de 34% para 41%, em um intervalo de apenas dois meses.
A pesquisa Genial/Quaest reforçou esse cenário ao revelar que, nos oito Estados analisados, a desaprovação do presidente supera a aprovação. Em seis deles, mais de 60% dos entrevistados avaliavam negativamente o governo.
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