Cá entre nós, o liberalismo no Brasil republicano foi sempre uma baderna, enfim, se houve um tanto que o republicanismo tupiniquim trouxe para o país foi o centralismo político e econômico, a perda de identificação vernáculo e a completa e estapafúrdia teoria de que políticos são uma espécie de senhores feudais abençoados, pessoas que nos permitem viver em silêncio e com certos benefícios caso entreguemos a eles partes generosas de nossos plantios e liberdades. Ora, cozinhar muito essa sopa de paternalismo misturado à canalhice, e ainda tutorar a teoria de autonomia individual, poderio das leis e sacralidade das liberdades fundamentais, é um trabalho duro para quem quer que seja.
Não obstante, depois um século desse sistema, tornou-se bizarramente cultural uma tendência de esperar sempre do Estado a solução de problemas, sejam dos públicos ou dos privados. Subsidiariedade, proatividade individual e o bom e velho “deixa que eu faço” foram gradualmente deixando de ser uma postura louvável em nosso Brasilzão. Esse, aliás, é um sistema que se retroalimenta, pois, se dependemos mais do Estado, ele precisa de mais numerário, o numerário que o Estado tem é o que ele tira do povo, e, para justificar a sangria cada vez maior de impostos, ele precisa fazer promessas cada vez mais mirabolantes: ensino livre, gratuita e universal; renda básica universal; saúde gratuita para todos; bolsas gás, família, masmorra etc. Todos esses são benefícios “gratuitos” pagos pelo próprio povo que o recebe de volta em forma de migalhas secas, em serviços podres e mal feitos. Porquê diria Winston Churchill: “Não há nada que o governo possa lhe dar que não tenha tirado de você antes”, o problema é que, quando o governo tira de você, isso cai num turbilhão secreto, num buraco preto intransponível de depravação, investimentos escusos e politiquice de momento. Não há com negar, a máxima liberal de que “imposto é roubo”, no Brasil parece ser quase uma obviedade.
O triste é que, quanto mais escravos somos desse sistema, mais criamos subordinação dele. Cachorros famintos são gratos por quaisquer sobras que lhes deem. O Estado brasílico se especializou, assim, em ser um mantenedor de pobreza, um sustentáculo de “o mínimo que se precisa para viver”, e ainda conseguir que muitos pobres sejam gratos por isso. Ora, essa é uma máquina quase perfeita de manutenção de poder: fazer com que o pobre esteja satisfeito em sua pobreza, tendo uma vez que herói o político e o Estado que mantêm sua miséria controlada.
Mas, vejam, eu disse “quase perfeita”, pois, uma vez que John Milton muito esclareceu em Areopagíticoa informação e a sátira livre libertam o povo das amarras psicológicas e policiais do Estado censor. Hoje, o pobre e a classe média ampla têm chegada a diversos meios de informação que extrapolam a mídia enviesada e amiga do poder, eles não dependem da clemência do editor de um jornal que recebe cheques do Estado no final da tarde, eles podem simplesmente entrar no X e consumir mídias alternativas, comentários de especialistas com ideias divergentes, pessoas com interpretações opositoras ou não. Hoje o Bastião, sentado no boteco do Dito, está lendo Oeste, Publicação do Povo e Risca do tempovendo Faroeste à Brasileira e Pânico. O monopólio da certeza, isto é, a máquina de propaganda do Estado e seus jornais vassalos, está tomando um pau de dar pena, e a verdade é que os donos do poder não sabem ao perceptível uma vez que mourejar com isso.
Um vídeo no Instagram, de um deputado do ordinário clero, o jovem Nikolas Ferreira, evangélico e conservador, furou todas as camadas de proteção midiática que o governo montou em volta de si e do povo. Com unicamente um vídeo no Instagram, o Bastião, que talvez não sabe se é de esquerda ou de direita, mas sabe que o seu numerário — fruto de seu trabalho difícil — é sagrado, protestou contra o rastreio do Pix que o governo Lula queria impor ao país. Igual ao Bastião existem outros milhões, e isso desencadeou uma resposta contundente demais para ser ignorada pelo sistema, e para além de acusar Nikolas e milhões de pessoas que repostaram o vídeo de “fazedores de notícias falsas”, a mídia pateticamente latiu durante dois dias em procura de atenção popular, num desespero cínico que, confesso, há muito eu não via. Um vídeo deixou ao menos quatro emissoras gigantes do país sem moral alguma no debate vernáculo, seus especialistas eram ignorados solenemente, suas opiniões se tornaram chacotas públicas.
A preço desse vídeo sobrepõe a estrato política imediata, é mais importante que o próprio recuo do governo, pois ele expõe muitas coisas que a retórica estatal e do Supremo Tribunal Federalista tentam esconder dos brasileiros. Eis o motivo real da luta governamental e jurídica incessante para exprobar as redes: fica mais fácil enganar e domar a satisfação popular quando o povo não tem recta ao contraditório, quando o povo não sabe ao perceptível o que o governo está fazendo por debaixo das camadas espessas de linguagem econômica empolada dos especialistas comprados.
Acabou o tempo no qual dependíamos da boa vontade da Mundo para trazer um técnico a término de explicar às pessoas comuns o que estava acontecendo em Brasília. Hoje, as pessoas digitam no YouTube o via que elas escolheram para colher as informações que lhes interessa, elas escolhem as fontes nas quais confiam. Com o vinda das redes sociais, quem determina é o povo, quem tem o cetro da escolha da informação é o Bastião e a Ana, e não o governo. Por isso, é necessário exprobar, eles estão perdendo o poder de dominância popular, e perder o poder de dominar é a única coisa que deixa um tirano sem dormir de noite.
Por término, sabe o que está colocando o governo Lula em parafuso, a velha mídia, acadêmicos e militantes esquerdistas em angústia absoluta? É que o Bastião, o Dito, a Ana e a Maria parecem estar se tornando liberais e conservadores. Eles estão opinando publicamente e suas opiniões vão para o lado contrário do que o sistema prega em suas catequeses, me parece que, cada vez mais, o varão generalidade está vendo que o Estado é o grande problema, e não a solução. Lula deve estar dormindo mal ultimamente.
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