O Prêmio Nobel de Economia de 2024, concedido a Daron Acemoglu, Simon Johnson e James Robinson, destacou a importância das instituições no desenvolvimento econômico. Esses economistas demonstram que a qualidade das instituições está diretamente relacionada à prosperidade das nações. Instituições criadas para explorar a população são prejudiciais ao crescimento de longo prazo, enquanto aquelas que garantem liberdades econômicas fundamentais e o Estado de Direito são essenciais para promover um ambiente de negócios favorável ao crescimento. Esse conceito é especialmente relevante para o Brasil, que enfrenta mais de quatro décadas de estagnação econômica, agravada por incertezas institucionais e políticas que minaram seu potencial de crescimento.
Um exemplo claro da aplicação prática dessas teorias do Nobel de Economia no contexto brasileiro é o estudo que realizei sobre a chamada “década perdida”, os anos 1980, período em que a economia do Brasil sofreu um colapso significativo que culminou com uma hiperinflação que ainda permanece na lembrança de muitos brasileiros. A hipótese central do estudo do Nobel de Economia é que a estagnação econômica brasileira, que se arrasta desde então, é resultado direto da deterioração do Estado de Direito e, em particular, da liberdade econômica. Durante esse período, o Brasil enfrentou graves violações dos direitos de propriedade, um desrespeito crescente aos contratos e uma instabilidade nas regras que governam a economia. Isso criou um ambiente hostil para o investimento privado, desestimulando o capital estrangeiro e nacional e, consequentemente, prejudicando o crescimento econômico do país.
É preciso garantir a segurança jurídica, o respeito aos contratos e a estabilidade das regras do jogo para criar um ambiente de negócios favorável ao investimento
Ao analisar as causas dessa estagnação, ficou claro que as políticas adotadas pelo Brasil a partir dos anos 1980 desempenharam um papel crucial na deterioração das instituições econômicas. O governo, em vez de promover reformas que fortalecessem o ambiente de negócios, optou por políticas intervencionistas e heterodoxas para lidar com a inflação e outros desafios econômicos. O aumento da participação estatal na economia, as restrições ao comércio internacional e as tentativas de controlar os preços e o câmbio tiveram um efeito devastador sobre a confiança dos investidores. Em vez de buscar um ambiente de mercado mais competitivo e aberto, o Brasil fechou suas portas ao comércio exterior e ao capital estrangeiro, agravando ainda mais a crise.
A teoria defendida por Acemoglu e seus colegas do Nobel de Economia propõe que a prosperidade depende de instituições inclusivas, que garantem a segurança jurídica e criam incentivos para o investimento e a inovação. No Brasil, no entanto, o que se viu foi o oposto: um aumento do controle estatal sobre a economia, acompanhado por uma instabilidade nas regras e um ambiente de incertezas jurídicas. A consequência direta dessa deterioração institucional foi o desincentivo ao investimento privado, o que comprometeu gravemente o potencial de crescimento do país.
No estudo, utilizo um modelo econométrico de análise contrafactual para avaliar como teria sido a trajetória de crescimento do Brasil caso o país tivesse adotado instituições mais fortes e inclusivas, tal como fizeram Chile, Colômbia e Coreia do Sul. O resultado é surpreendente: o Produto Interno Bruto (PIB) per capita do Brasil poderia ter sido praticamente o dobro em 2000 se tivéssemos um ambiente de negócios mais estável e previsível. A perda de crescimento ao longo das duas décadas após 1980 foi estimada em 48,19%, uma evidência clara de que a deterioração das instituições teve um impacto direto e significativo sobre a estagnação econômica.
Durante os anos 1980, o Brasil enfrentou choques externos severos, como a crise do petróleo e o aumento das taxas de juros internacionais. Em vez de aproveitar esses desafios para implementar reformas estruturais que fortalecessem as instituições e restaurassem a confiança dos investidores, o governo brasileiro adotou políticas que agravaram ainda mais a situação. O controle de preços, as desvalorizações cambiais sucessivas e as medidas de intervenção estatal tornaram o ambiente econômico ainda mais instável. A incerteza gerada por essas políticas impediu que os empresários e investidores tivessem segurança suficiente para alocar recursos em projetos de longo prazo.
Além disso, a Constituição Federal de 1988 trouxe mais complicações ao ambiente institucional. Embora tenha consolidado princípios como a livre iniciativa e a livre concorrência, ela também estabeleceu cláusulas que comprometiam a liberdade econômica, como a função social da propriedade e privilégios a empresas nacionais. Essas medidas foram um desincentivo adicional ao investimento privado, uma vez que enfraqueceram os direitos de propriedade e introduziram incertezas no cumprimento dos contratos. O estudo deixa claro que o país pagou um alto preço pela falta de reformas que promovem a liberdade econômica. Em vez de crescer como outras nações que optaram por reforçar suas instituições, o Brasil seguiu um caminho que o afastou do progresso.
O trabalho de Acemoglu, Johnson e Robinson, ganhadores do Nobel de Economia, traz um alerta importante para o Brasil. A deterioração das instituições, causada por políticas intervencionistas, enfraqueceu e continua a enfraquecer a capacidade do país de crescer e se desenvolver. Apesar da necessidade de reformas, as instituições econômicas brasileiras, que poderiam promover uma maior liberdade econômica, permanecem frágeis. Países com maior liberdade econômica tendem a estimular mais atividades empreendedoras e apresentam uma correlação positiva com maior renda per capita e crescimento econômico.
No entanto, os indicadores mais recentes posicionam o Brasil em níveis preocupantes nos rankings de liberdade econômica, ocupando as 113ª e 127ª posições nos índices do Frasier Institute de 2020 e da Heritage Foundation de 2023, respectivamente. O relatório da Heritage Foundation de 2023, por exemplo, destaca as baixas pontuações do Brasil em corrupção e direitos de propriedade, além de destacar a vulnerabilidade do sistema judicial à interferência política.
Diante desse contexto, o que se faz necessário, portanto, é uma agenda de reformas estruturais que fortaleçam as instituições brasileiras. É preciso garantir a segurança jurídica, o respeito aos contratos e a estabilidade das regras do jogo para criar um ambiente de negócios favorável ao investimento. Essas reformas não são apenas desejáveis, mas são essenciais para que o Brasil possa finalmente romper com o ciclo de estagnação que o impede de atingir seu verdadeiro potencial econômico. Somente assim poderemos transformar o Brasil de uma promessa constante de ser o “país do futuro” em uma realidade próspera no presente.
Cristiano Oliveira, doutor em Economia, é head of research na fintech Rivool Finance.
leia o artigo original em www.gazetadopovo.com.br