O governo encaminhou ao Supremo Tribunal Federalista (STF) uma proposta mais abrangente e rígida de moderação de teor nas redes sociais, dentro do processo em julgamento na Incisão sobre o Marco Social da Internet. As sugestões do órgão para o tribunal se assemelham a itens do Projeto de Lei 2630/2020 – que ficou publicado porquê PL da Repreensão – que buscava ampliar a regulamentação das plataformas digitais, mas que travou na Câmara por falta de pedestal suficiente dos deputados.
Na última quarta (27), os ministros do STF começaram a averiguar a constitucionalidade do item 19 da lei do Marco Social da Internet, pelo qual as plataformas não podem ser responsabilizadas na Justiça por postagens lesivas publicadas por seus usuários. No início do julgamento, o presidente da Incisão, Luís Roberto Barroso, admitiu que pautou o tema porque o Congresso não aprovou uma novidade lei sobre o tema.
O julgamento no STF do Marco Social da Internet será retomado nesta quarta-feira (4), com a perenidade do voto de Dias Toffoli, relator do tema, que defendeu uma atualização na lei.
A regulamentação em vigor do Marco Social da Internet, aprovada pelo Legislativo em 2014, diz que as redes sociais só podem tolerar punições – na forma de uma indenização por danos morais, decorrente de uma publicação ofensiva, por exemplo – caso uma decisão judicial considere determinado teor ilícito e a rede social descumpra uma ordem de remoção dessa publicação.
O governo pediu para participar do processo, por meio da Advocacia-Universal da União (AGU), na requisito de amicus curiae (“amigo da Corte”), nome que se dá a entidades ou instituições afetadas ou interessadas no tema.
Uma vez que mostrou a Jornal do Povo, a proposta inicial da AGU era que, antes de qualquer decisão judicial a reverência do teor de uma postagem, a rede social adotasse um “dever de precaução”, para remover, por iniciativa própria, conteúdos, canais, perfis ou contas que publicarem conteúdos que violem “direitos da criança e do adolescente, a integridade das eleições, a defesa do consumidor, e a prática de ilícitos penais, desinformação e outras situações que importem em violação à legislação”.
Na prática, caberia às plataformas monitorar as postagens feitas por usuários – seja em texto, vídeo ou áudio – e julgar se nelas há alguma sintoma que poderia se enquadrar nesses ilícitos. A partir disso, a plataforma teria a obrigação de remoção desses conteúdos, sob pena de responder por eles na Justiça. As empresas de tecnologia rechaçam esse padrão, por considerarem que ele favorece a exprobação privada. A lógica é que, para mitigar o risco de serem punidas, as redes sociais se veriam impelidas a retirar qualquer teor discutível ou polêmico do ar.
“A União Federal sugere um dever individualizado de cuidado, tecnicamente inviável e desconhecido no mundo, em que, independentemente de prévia análise pelo Judiciário, seria da alçada da plataforma supor a ocorrência do ilícito caso a caso, o que extrapola o razoável”, afirmou o Facebook em sintoma enviada ao STF em seguida a proposta inicial do governo.
Na última quinta-feira (28), em sustentação vocal, o advogado-geral da União, Jorge Messias, defendeu no plenário a inconstitucionalidade do item 19 do Marco Social da Internet.
A novidade proposta do governo para o STF regulamentar as redes sociais
No último dia 26, véspera do início do julgamento, a AGU enviou um memorial ao STF, sintetizando sua visão sobre a questão e apresentando uma novidade proposta de moderação de teor pelas redes sociais, mais ampla e minuciosa.
No documento, a AGU propôs que as plataformas digitais tenham por exigência um “dever de prevenção e precaução permanente e direta” para indisponibilizar, sem qualquer decisão judicial, manifestações que se enquadrem nas seguintes categorias:
- crimes contra o Estado Democrático de Recta (extinção violenta do Estado Democrático de Recta, golpe de Estado, interrupção do processo eleitoral, violência política e sabotagem) muito porquê a incitação ou apologia desses delitos;
- atos de terrorismo e preparatórios de terrorismo, conforme tipificação prevista na Lei nº 13.260/2016;
- crimes praticados contra crianças e adolescentes previstos no ECA (incluindo a promoção de envio ilícito de menores para o exterior e também produção e exposição de pornografia infantil), muito porquê a incitação ou apologia desses crimes;
- crimes contra a saúde pública (venda de remédios falsos ou proibidos, ou substâncias nocivas, e charlatanismo);
- transgressão de discriminação ou preconceito em razão de raça, cor, etnia, religião ou proveniência vernáculo, conforme tipificado no art. 20 da Lei nº 7.716/1989;
- “divulgação de fatos notoriamente inverídicos ou gravemente descontextualizados que atinjam a integridade do processo eleitoral”;
- transgressão de persuasão, instigação ou auxílio a suicídio, ou a automutilação, tipificado no art. 122 do Código Penal.
A AGU ainda propôs o “dever de precaução” das redes para retirar conteúdos que possam ser considerados em categorias mais abertas e indefinidas, porquê aqueles que “violam”:
- a proteção de crianças e adolescentes, conforme disposto no ECA;
- normas de proteção e a resguardo do consumidor, “especialmente, os direitos de proteção contra publicidade enganosa e abusiva, bem como da vida, saúde e segurança”.
Em outra secção da proposta, a AGU defendeu que, em alguns outros casos, a plataforma seja responsabilizada quando, em seguida notificação extrajudicial da vítima ou interessado, se omitir em caso de “fraudes na invasão de perfis e contas ou criação de perfis e contas fraudulentos em nome de terceiros”. O órgão faz a salvaguarda de que as redes não poderiam ser punidas caso o perfil falso seja de sátira, sátira ou paródia.
A AGU ainda propõe responsabilização se, em seguida notificação extrajudicial, a rede social não retirar do ar “manifesta e deliberada desinformação em matéria de políticas públicas e de legitimação de função pública”.
A própria AGU, numa secção anterior do documento, deu exemplos de porquê vem atuando junto às plataformas para coibir esse tipo de teor – todos relacionados a manifestações negativas ao relação ao atual governo, mas que, para o órgão, continham “desinformação” ou “discurso de ódio”.
“A Procuradoria Nacional de Defesa da Democracia – PNDD/AGU, a partir de parâmetros objetivos, impessoais e internacionalmente reconhecidos, vem atuando em defesa da ação pública em casos que envolvem a divulgação anônima, intencional e monetizada de desinformação (como uma suposta intenção de confisco de poupanças); da legitimidade das funções públicas, em casos como a veiculação de discurso de ódio político e incitação à violência em face do Presidente da República, Ministros de Estado e Ministros desse Suprema Corte; das políticas públicas, como os que envolvem a vacinação e os eventos climáticos extremos”, diz o parecer.
No início deste ano, a Procuradoria Pátrio de Resguardo da Democracia (PNDD) passou a pressionar as redes a extinguir postagens críticas ao governo federalista em seguida as enchentes no Rio Grande do Sul, sob alegado de que continham mentiras sobre a ajuda prestada a desabrigados e a facilidade com que chegavam as doações à população atingida.
No memorial (processo movido pelo governo), a AGU também sugeriu ao STF que, em caso de remoção de conta ou rotulação do teor, haja notificação ao responsável; fundamentação da decisão, apontando a justificação “de maneira clara e específica, em língua portuguesa”; e seja facultado um prazo para a pessoa censurada pedir a revisão, ao qual a plataforma terá de dar uma resposta “de modo fundamentado e objetivo” e em “em prazo razoável”. A plataforma ainda deverá, pela proposta da AGU, preservar os dados de conteúdos que violem direitos, que sirvam de prova para a responsabilização do responsável.
Por término, o governo quer que o STF obrigue as redes a publicar relatórios de transparência periódicos sobre a moderação de teor, “com informações quantitativas e agregadas por operação, em formato aberto”. Aliás, o governo requer a “disponibilização de repositórios de publicidade digital permanentemente atualizados, contendo a íntegra dos anúncios veiculados, acompanhada de informações precisas sobre a identidade do anunciante, os valores pagos pela veiculação e as características gerais da audiência contratada”.