Desde o dia 23 de abril, quando a Polícia Federal (PF) deflagrou, em parceria com a Controladoria-Geral da União (CGU), a Operação Sem Descontoidosos, aposentados e pensionistas de todo o Brasil se dão conta de descontos associativos indevidos em seus extratos do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
Conforme um relatório da CGU, o órgão identificou que 7,6 milhões de aposentados e pensionistas do INSS sofrem descontos na folha de pagamento. Ao todo, foram cerca de 1,2 milhão de pessoas com reclamações sobre decréscimos indevidos. A pesquisa também sugere que 98% dos aposentados e pensionistas já foram vítimas de descontos indevidos.
A investigação da PF teve como alvo, além da alta cúpula do INSS, 11 entidades parceiras do instituto. Muitas vezes associações ou sindicatos de aposentados e pensionistas, elas teriam descontado mensalidades indevidamente ou sem o consentimento dos beneficiários, entre 2019 e 2024. O valor da fraude gira em torno de R$ 6,5 bilhões.
“Soube dos descontos indevidos através das denúncias apresentadas nos meios de comunicação”, disse uma fonte de São Paulo ouvida por Oeste. Filho de um aposentado de 90 anos que contribuiu ao INSS por mais de 30 anos, o homem não quis ter sua identidade revelada.
Contudo, ao contrário da data divulgada, ao checar os extratos do pai, ele encontrou descontos indevidos desde junho de 2008. Corrigidos pela inflação e atualizados, as cifras chegam a R$ 5 mil.
“Fique abismado, o sentimento é de total impotência, descaso e desrespeito”, afirmou o idoso. “É terrível, você, com 90 anos de idade, ser enganado, por tanto tempo. Fui roubado, precisando do dinheiro para outras finalidades.”
INSS deve restituir parte do prejuízo


Na última quinta-feira, 8, o novo presidente do INSS, Gilberto Waller Júnior, anunciou que os aposentados e pensionistas vítimas de descontos não autorizados de mensalidades associativas serão ressarcidos pelos prejuízos sofridos entre março de 2020 e março de 2025. Segundo Waller, na próxima terça-feira, 14, o instituto começará a notificar cerca de 9 milhões de beneficiários da Previdência Social.
“Eu preciso receber esse dinheiro de volta”, afirmou o idoso, a Oeste. “É uma questão de necessidade, de direito. Esse é o meu dinheiro, e nunca dei autorização a ninguém para retirá-lo da minha conta.”
Apesar disso, há grande preocupação com os mecanismos que o INSS vai utilizar para realizar os trâmites necessários para a devolução do dinheiro. Isso porque a maioria das ações ocorre pela internet, e muitos idosos não estão acostumados com ferramentas on-line.
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“Como um idoso, que seja analfabeto digital, pode realizar estes processos sozinho?”, perguntou. “Deveria ser mais fácil!”
Outros relatos
No portal Reclame aqui, amplamente usado por brasileiros para registrar queixas de empresas e serviços, há diversas reclamações. Um aposentado de São Francisco de Itabapoana (RJ) escreveu que a associação que aparece em seu contracheque é a Confederação Nacional de Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais (Conafer).
“Desde fevereiro de 2023 estão descontando indevidamente um valor de contribuição da Conafer”, escreveu o beneficiário do INSS.
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Já um usuário de Fortaleza afirmou que a mesma instituição, a Conafer, realiza descontos em sua aposentadoria desde 2023, que aumentaram de R$ 26,40 para R$ 42,50 mensais. “Eu não autorizei nenhuma cobrança dessa instituição que está descaradamente retirando valores da minha aposentadoria, que já é pouca”, relatou.
Investigação parlamentar
Parlamentares tanto da Câmara dos Deputados quanto do Senado Federal reúnem assinaturas para tentar a abertura de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI). O objetivo é apurar o rombo no INSS. Até o momento, há pouco mais de 210 adesões.
Desse total, 81 deputados e 11 senadores são de seis partidos com representantes no primeiro escalão do governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Contudo, não há nomes do Partido dos Trabalhadores na lista. A sigla do presidente defende que a operação da PF desmontou um esquema remanescente da gestão anterior, de Jair Bolsonaro.
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A fonte ouvida por Oeste tem na CPMI uma esperança de luta por seus direitos. “Sou a favor”, afirmou. “Alguém tem que nos proteger, defender, respeitar. Só as demissões promovidas por Lula (Stefanutto e Lupi, então presidente do INSS e ministro da Previdência, respectivamente) não são o bastante. Com esse discurso, o governo se mostra parcial, conivente e vulnerável.”