A denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) apresentada nesta terça-feira (18) contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), acusado de tramar golpe de Estado, vem no momento que o seu principal rival político, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), sofre impopularidade recorde.
A notícia gerou forte repercussão no meio político, com parlamentares governistas comemorando e pedindo punição aos 34 acusados. Os aliados de Bolsonaro, por sua vez, mostraram indignação e revolta, descrevendo a denúncia como inconsistente e perseguição ao principal líder da direita.
Na denúncia da PGR, o suposto projeto de golpe abrange um período preparatório às eleições de 2022 e vai até o protesto de 8 de janeiro de 2023. A apresentação da denúncia e o julgamento ainda neste ano estão atrelados ao calendário da eleição presidencial de 2026.
Bolsonaro e aliados veem ação para barrar sua presença nas urnas de 2026
Confira:
- 1 Bolsonaro e aliados veem ação para barrar sua presença nas urnas de 2026
- 2 Parlamentares da oposição destacam inconsistência da denúncia
- 3 Governistas celebram denúncia quando Lula tem impopularidade histórica
- 4 Expectativa de apresentação de denúncia já mobilizava governo e oposição
- 5 Maior impacto da denúncia está na pressão por uma reação do Congresso
- 6 Bolsonaro e aliados articulam apoio do Centrão para aprovar projetos
- 7 Metodologia das pesquisas citadas
Na entrevista que deu no Senado, após reunir-se com a oposição, poucas horas antes da apresentação da denúncia, Bolsonaro, que tenta reverter sua inelegibilidade até 2030, lembrou episódios que indicam parcialidade dos ministros do STF, prejudicial à sua candidatura presidencial, desde 2022.
“Estão com medo de quê? Pesquisa recente para presidente em 2026 dá Bolsonaro cinco pontos percentuais à frente de Lula”, disse a deputada Bia Kicis (PL-DF), repetindo fala do ex-presidente. O levantamento do Paraná Pesquisas ainda mostra a ex-primeira-dama Michelle superando o petista (veja a metodologia abaixo).
A parlamentar também lembrou que as mais de 800 páginas do inquérito da Polícia Federal (PF), que serviu de base para a denúncia, apontaram 207 palavras condicionantes, como “possível”, “suposto”, “teria” e “hipotética”. “Apenas o termo possibilidade aparece 47 vezes ao longo do texto”, destaca.
Parlamentares da oposição destacam inconsistência da denúncia
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) afirmou que “a tentativa de golpe nos prédios públicos vazios virou denúncia vazia”, por não ter “absolutamente nenhuma prova” contra seu pai. Ele também criticou o STF e o ministro Alexandre de Moraes por agirem de forma interessada e enviesada.
O líder da oposição no Senado, Rogério Marinho (PL-RN), afirmou que “a injustiça, o arbítrio e a perseguição não conseguirão calar o sentimento da população e o que o presidente Jair Bolsonaro representa”. O senador Ciro Nogueira (PP-PI) acrescentou: “Bolsonaro é honesto, de bem e inocente”.
Para o deputado Gustavo Gayer (PL-GO), a denúncia da PGR sem provas cabais representou um dia vergonhoso para a história brasileira e uma agressão à democracia, ao confirmar um movimento do STF e do governo para tirar Bolsonaro da disputa de 2024, além de perseguir os políticos de direita.
Governistas celebram denúncia quando Lula tem impopularidade histórica
Os parlamentares que apoiam Lula receberam a apresentação da denúncia, contudo, com entusiasmo. O líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), celebrou o relatório contra Jair Bolsonaro e destacou que o ex-presidente poderá “pegar até 28 anos de cadeia”.
O senador Humberto Costa (PT-PE) defendeu, por sua vez, que os acusados sejam responsabilizados: “Tramaram dia e noite o fim da democracia, colocaram os seus interesses acima da vontade popular. Eles precisam pagar pelos crimes”.
“A denúncia é uma decisão da PGR (…) e eu não vou comentar um processo que está na Justiça. A única coisa que posso dizer é que, nesse país, no tempo em que eu governo o Brasil, todas as pessoas têm direito à presunção de inocência. Se eles provarem que não tentam dar golpe e matar o presidente, (…) eles ficarão livres e serão cidadãos que vão transitar no Brasil inteiro”, disse Lula.
Pesquisa Datafolha divulgada na sexta-feira (14) revelou que apenas 24% dos eleitores aprovam a gestão de Lula, enquanto 41% a desaprovam, 32% a tem como regular e 2% não comentam. O menor índice que ele já teve (28%) foi entre outubro e dezembro de 2005, no auge do escândalo do mensalão – esquema de corrupção para compra de apoio de parlamentares no primeiro mandato do petista.
Expectativa de apresentação de denúncia já mobilizava governo e oposição
Para analistas, a pressa em julgar Bolsonaro e demais acusados ainda neste ano reflete não só a disputa presidencial, mas também o receio de membros do STF com a perspectiva de o Senado alcançar maioria conservadora em 2027, além do contexto trazido pela volta de Donald Trump à Casa Branca.
A apresentação da denúncia adiou até o jantar entre Lula e ministros do STF, que estava marcado para esta quarta-feira (19). O procurador-geral da República, Paulo Gonet, também convidado, avisou que não iria para evitar críticas. Lula e os ministros já tiveram encontros informais em residências dos ministros.
O ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, já disse que a conclusão do relatório da PF sobre a suposta tentativa de golpe só foi possível devido à “isenção” do governo: “a entrega (em 24 de novembro) do inquérito só foi possível porque a corporação teve toda a autonomia”.
Maior impacto da denúncia está na pressão por uma reação do Congresso
A batalha jurídica que se inicia no Supremo Tribunal Federal (STF) após uma inédita acusação a um ex-presidente, por suposta tentativa de golpe para seguir no poder, se desdobra no Congresso, onde se debate uma proposta de anistia a réus do 8 de janeiro de 2023 e alterações na Lei da Ficha Limpa.
A expectativa é de que a disputa parlamentar, menos previsível que a jurídica, possa resultar no fortalecimento das forças de direita do país e ainda enseje uma reação do Legislativo contra a interferência do STF no jogo eleitoral. A oposição vê o tribunal como parcial e um aliado estratégico de Lula.
Apoiadores de Bolsonaro organizam protestos em todo o país para o próximo 16 de março contra o governo. Seus líderes estão divididos quanto ao foco principal dos eventos: se deve ser o pedido de impeachment de Lula ou a aprovação da anistia a condenados do 8 de janeiro, discussão acentuada após a denúncia.
Bolsonaro e aliados articulam apoio do Centrão para aprovar projetos
Caso a denúncia seja aceita, Bolsonaro será julgado pela 1ª Turma do STF – composta por Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Luiz Fux, Flávio Dino e Cristiano Zanin. Esses ministros seguiram a linha de Mores em outras votações. Zanin preside o colegiado até setembro, quando dará lugar a Dino.
A eventual condenação de Bolsonaro por abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe, organização criminosa, dano qualificado por violência e grave ameaça, além da deterioração de patrimônio tombado, contraria diretamente o seu desejo de ser candidato em 2026.
Nessa toada, Bolsonaro intensificou contatos com líderes do Centrão para viabilizar o projeto de anistia. Em encontros com Gilberto Kassab (PSD) e Antônio Rueda (União Brasil), ele buscou apoio à iniciativa. Seus aliados acreditam que anistia pode derrubar a inelegibilidade imposta pelo TSE.
Nesta terça-feira (18), o ex-presidente afirmou que o projeto de anistia já tem votos suficientes na Câmara. Mas avaliou que o projeto que altera a Lei da Ficha Limpa – reduzindo o prazo de inelegibilidade de oito para dois anos para políticos condenados – ainda precisa ser amadurecido.
Metodologia das pesquisas citadas
O Paraná Pesquisas ouviu 2.010 eleitores em 162 municípios de 26 estados e no Distrito Federal entre os dias 13 e 16 de fevereiro. A margem de erro é de 2,2 pontos percentuais, com índice de confiança de 95%.
A pesquisa Datafolha ouviu presencialmente 2.007 pessoas, de 16 anos ou mais, entre 10 e 11 de fevereiro. A margem de erro geral do levantamento é de 2 pontos percentuais para mais ou para menos.