O anúncio do papa Leão XIV como o novo líder da Igreja Católica, nesta quinta-feira (8), surpreendeu muitos fiéis, já que o cardeal Robert Prevost não era visto como um dos mais propensos a ser eleito. Ainda maior foi a surpresa dos religiosos agostinianos de todo o mundo – o novo papa faz parte da Ordem de Santo Agostinho (OSA), ou seja, é um agostiniano.
Leão XIV ingressou no noviciado da OSA em 1977, nos Estados Unidos, na província de Nossa Senhora do Bom Conselho e liderou a Ordem de Santo Agostinho como Prior Geral por 12 anos, entre 2001 e 2013. O cargo é, basicamente, o superior máximo da ordem no mundo, ou seja, o líder administrativo geral.
Para se ter uma ideia de quanto a escolha é importante para os agostinianos, o último cardeal dessa ordem que havia participado de um conclave foi o Frei Sebastiano Martinelli, há mais de 120 anos, quando São Pio X foi escolhido como novo papa. Em 2013, o cardeal Prosper Grech, da OSA, participou do conclave que elegeu o papa Francisco, mas não votou porque já havia ultrapassado os oitenta anos. Hoje estima-se que haja em torno de quatro mil religiosos agostinianos – número que inclui apenas homens.
“Todos nós estamos festejando, imagino que em todos os lugares do mundo. Para nós é um momento novo, de muita esperança”, comemorou Frei Luiz Antônio Pinheiro, Prior da Província Agostiniana Nossa Senhora da Consolação do Brasil, emendando que acredita que Leão XIV mantenha a linha do papa Francisco.
O que significa ser um agostiniano?
A inspiração desses religiosos está na vida e no pensamento de Agostinho (354-430), um dos mais conhecidos santos da história da Igreja. Agostinho foi um doutor da Igreja e é considerado padroeiro dos teólogos, por isso os agostinianos têm forte tradição acadêmica, com muitos estudiosos importantes ao longo dos séculos.
Outro aspecto relevante entre os agostinianos é a vida comunitária – Agostinho acreditava que ninguém se realiza sozinho, e o lema desses religiosos é, justamente, “Um só coração e uma só alma em Deus”enfatizando a fraternidade.
Outro valor que vem da tradição de Agostinho é a busca pela reconciliação e a paz. Não por coincidência, a palavra “paz” foi repetida diversas vezes no primeiro discurso de Leão XIV após tornar-se papa. Após o anúncio do nome do novo papa, nesta quinta (8), jornais de todo o mundo repercutiram sua posição pró-unidade e reconciliação, especialmente num momento de tensões ideológicas dentro da Igreja, entre as alas progressista e conservadora.
“O papa Francisco era jesuíta, e o novo papa é agostiniano. Embora sejam de ordens diferentes, a essência da vida religiosa é a mesma; os votos evangélicos de pobreza, castidade e obediência são os mesmos”, explica Frei Maurício Manosso Rocha, Prior Provincial da Província Agostiniana do Brasil.
O que é a Ordem de Santo Agostinho e quais as ramificações agostinianas
A Ordem de Santo Agostinho foi fundada na Itália, no século XIII (em 1244), quando vários grupos de eremitas que seguiam a Regra de Santo Agostinho foram unidos em uma única estrutura. Seu objetivo era viver em comunidade, buscando Deus através da oração, do estudo e do serviço pastoral.
A ordem combina vida comunitária com atuação prática em paróquias, escolas, universidades, missões e projetos sociais. Segundo o site oficial da Ordem, há aproximadamente 2.700 religiosos professos pelo mundo, incluindo padres, irmãos e irmãos em formação, espalhados por mais de 40 países.
“Seguindo o exemplo do próprio Santo Agostinho, reconhecido por seu profundo apreço pelo saber, nós, enquanto agostinianos, embora não dotados de um serviço especializado nesse âmbito, empenhamo-nos de maneira vigorosa na seara da educação. Além disso, nosso compromisso é evidenciado através do intenso labor de assistência pastoral em paróquias e também por meio de iniciativas voltadas à promoção do bem-estar social em diversas obras de caridade”, informa o site brasileiro da Ordem.
Tendo a OSA como tronco principal, ao longo do tempo foram surgindo ramificações agostinianas, cada uma com características próprias, mas mantendo a essência da filosofia de Agostinho. Algumas delas são:
Agostinianos Recoletos: surgiram no final do século XVI como um movimento de renovação e vida mais austera dentro da ordem original. Os recoletos têm forte presença missionária, especialmente na América Latina e nas Filipinas. Segundo o site oficial da ordem, há cerca de mil religiosos com presença em 20 países.
Agostinianos Descalços: também surgiram no final do século XVI, com ênfase na vida contemplativa, simplicidade e pobreza radical. Estão presentes principalmente na Europa e na América Latina. Dados de diretórios eclesiais estimam cerca de 200 a 300 religiosos.
Agostinianas e congregações femininas: incluem várias congregações de irmãs e monjas, como as Agostinianas Missionárias, Agostinianas Descalças e outras, que atuam em educação, saúde, assistência social e vida contemplativa.
“Agostinho fundou diversas comunidades e então, a partir da sua morte, no ano de 430, alguns grupos começaram a viver sobre a Regra de Santo Agostinho. Essa grande união da ordem se deu em 1244 pelo papa Inocêncio IV”, explica Frei Maurício Rocha.
“Depois de alguns séculos teve uma divisão na ordem, e dela saiu um grupo que formou os Agostinianos Recoletos, que são outra ordem. Mais tarde, dentro dos Recoletos, saiu outro grupo que formou a Ordem dos Agostinianos Descalços. Mas a Ordem à qual o papa pertence é a originária, a OSA, formada em 1244”, conclui.
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