Mesmo sem um Orçamento da União aprovado para 2025 e diante da mobilização por outras pautas como a da anistia aos presos do 8 de janeiro de 2023, a cúpula do Congresso Nacional articula para avançar com um pacote de medidas que alteram as regras eleitorais.
A movimentação neste momento tem como foco as eleições de 2026, pois qualquer mudança precisa estar sancionada até outubro deste ano. A legislação exige que estas alterações estejam em vigor com até um ano de antecedência do próximo pleito.
A articulação mais avançada está no Senado Federal, onde tramita o chamado “novo código eleitoral”, que tem como objetivo consolidar todo o regramento eleitoral em uma única legislação. O texto foi aprovado na Câmara em 2021 e, no final do ano passado, o senador Marcelo Castro (MDB-PI) apresentou o seu relatório para apreciação dos senadores.
Uma das principais mudanças em relação ao texto aprovado pelos deputados diz respeito à publicação de pesquisas de intenção de voto na véspera e no dia do pleito. A Câmara vetou esse tipo de divulgação, mas o relatório do emedebista traz novamente essa possibilidade para o texto.
Segundo Marcelo Castro, uma das inovações do seu parecer é a exigência de que os institutos informem o percentual de acerto das pesquisas realizadas com base nas três últimas eleições. A ideia é que um comparativo seja feito entre a pesquisa com as intenções de voto e os votos efetivamente registrados nas últimas eleições, com objetivo de mostrar para o eleitor se a empresa é confiável.
“Se teve uma disparidade muito grande, esse instituto não merece crédito e se teve uma proximidade, esse instituto merece crédito. Vai ficar patente para a opinião pública se o instituto fez ou não fez manipulação de pesquisa, que a gente sabe que isso existe no Brasil inteiro. Em todos os municípios, em todos os estados do Brasil tem sempre algum instituto sem credibilidade procurando vender pesquisas”, explicou Marcelo Castro.
Novo código eleitoral esvazia fiscalização dos partidos políticos
Confira:
Um dos pontos mais controversos do projeto do novo código eleitoral trata sobre o fim da padronização do Sistema de Divulgação das Prestações de Contas Anuais (SPCA). Essa mudança deve impactar, principalmente, na atuação da Justiça Eleitoral, já que exclui a possibilidade de apuração de irregularidades, como superfaturamento e desvios de recursos públicos de campanha.
“Ainda que eu ache que o Tribunal Eleitoral, muitas vezes, tenha exagerado na mão e adotado medidas exageradas — isso precisa ser discutido —, não dá para tirar a prestação de contas parcial. Esta proposta está a serviço de partido, de cacique partidário, não tem nada a ver com democracia, não tem nada a ver com ajuste consensuado, que foi o objetivo”, argumentou a deputada Adriana Ventura (Novo-SP) durante a tramitação do projeto na Câmara.
Atualmente, as campanhas eleitorais são financiadas com dinheiro público, por meio do chamado fundo eleitoral. No ano passado, para as eleições municipais, foram destinados R$ 4,9 bilhões para os partidos político. O mesmo montante foi gasto na campanha presidencial de 2022.
Projeto altera forma de contabilizar o período de inelegibilidade
Além disso, o relator do Senado manteve o trecho aprovado pela Câmara que altera o a forma de contabilizar os prazos de inelegibilidade. Como mostrou a Gazeta do Povoesse tema ganhou projeção no começo deste ano com o projeto do deputado Bibo Nunes (PL-RS), que reduz de oito para dois anos, o período de inelegibilidade de políticos enquadrados na Lei da Ficha Limpa.
No projeto do novo código eleitoral, o relatório do senador Marcelo Castro limita a inelegibilidade a até oito anos, estabelecendo que seu início é a data da decisão judicial. Hoje, os oito anos de inelegibilidade começam a contar a partir do final do cumprimento da pena imposta ou do mandato para o qual o político foi eleito, o que na prática dá mais de oito anos.
O projeto está atualmente para ser votado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), antes de seguir para o plenário da Casa. Segundo o senador Otto Alencar (PSD-BA), próximo presidente do colegiado, essa proposta será uma das prioridades neste primeiro trimestre de 2025.
“Esse tema será tratado a partir das instalações das comissões, vamos dar prioridade já que o senador Marcelo Castro já apresentou o relatório e é uma matéria que precisa ser colocada em votação”, indicou Alencar ao ser questionado por jornalistas no Congresso.
PEC unifica eleições e acaba com a reeleição no Brasil
Outro tema que vai ser alvo de discussão pelos senadores, ainda neste ano, diz respeito à Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que unifica as eleições e acaba com a possibilidade de reeleição para cargos do Executivo. O projeto também está sob a relatoria de Marcelo Castro, mas ainda não houve apresentação de relatório.
Esse tema começou a ser discutido ainda na gestão de Rodrigo Pacheco (PSD-MG) no comando do Senado e deve ser retomado agora, com a presidência de Davi Alcolumbre (União-AP). A expectativa é de que essa discussão seja feita pelo Colégio de Líderes logo após o Carnaval.
“Precisamos acabar com esse modelo de eleições a cada dois anos, ou ele acaba com o Brasil e com o Congresso Nacional”, afirmou Otto Alencar.
Além de unificar as eleições municipais com as nacionais, a ideia seria estabelecer um mandato de cinco anos sem a possibilidade de reeleição.
“(A reeleição) não tem trazido benefício ao país. É um malefício a reeleição para cargos executivos no Brasil. Estamos propondo uma PEC, pondo fim à reeleição e estendendo o mandato para cinco anos, porque a maioria (dos senadores) entende que, sem a reeleição, um mandato de quatro anos ficaria muito exíguo para um prefeito, governador ou presidente da República executar seus projetos”, argumenta Marcelo Castro.
Para tentar reduzir possíveis resistências, uma das estratégias entre os senadores que defendem a proposta seria implementar a regra a partir de 2030, mas ainda não há entendimento a respeito disto. Para ser aprovada, a PEC precisa de 49 votos dos 81 senadores, e ainda precisaria seguir para votação na Câmara.
Comissão da Câmara vai discutir inelegibilidade e semipresidencialismo
Assim como no Senado, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), já indicou que pretende instalar uma comissão especial para discutir propostas sobre as regras eleitorais. A expectativa é de que essa instalação aconteça após o feriado de Carnaval.
Um dos principais temas que será levado ao colegiado é justamente o projeto que esvazia a Lei da Ficha Limpa, reduzindo de oito para dois anos o prazo de inelegibilidade. A mudança ganhou força na oposição como forma de tentar reaver os direitos políticos do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) até 2026.
Bolsonaro foi condenado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em 2023, por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação após levantar dúvidas sobre a credibilidade das urnas eletrônicas. Posteriormente, ele foi condenado novamente à inelegibilidade, dessa vez por abuso de poder político e econômico por suposto uso eleitoral das cerimônias do Bicentenário da Independência, em 7 de setembro de 2022.
Com base na legislação atual, o ex-presidente está proibido de disputar um cargo público por oito anos e, caso não consiga reverter a decisão, ele só poderá disputar uma eleição em 2030.
“Vamos, sim, colocar Bolsonaro para concorrer à eleição de 2026, porque nós vamos tirar sua inelegibilidade, já que não há nenhum motivo para ele estar inelegível. Ele está inelegível simplesmente por ter participado de uma reunião com embaixadores? Ou por ele ter participado do movimento que houve no dia 7 de setembro? Isso é considerado ilegal? Não sei onde”, defendeu o deputado Giovani Cherini (PL-RS).
Outra pauta que será discutida dentro da comissão especial da Câmara será a PEC do semipresidencialismo, apresentada no começo deste mês pelos deputados Luiz Carlos Hauly (Podemos-PR) e Lafayette Andrada (Republicanos-MG). A proposta conta com a simpatia de Hugo Motta. O modelo prevê que o chefe do Executivo dividiria o poder com um primeiro-ministro, que seria escolhido pelo Congresso Nacional.
“Esse quadro institucional precisa ser revisto para que, em caso de uma nova crise institucional envolvendo o presidente da República, o Brasil não enfrente as prolongadas e incertas crises institucionais que antecederam as quedas de (Fernando) Collor e Dilma (Rousseff) e acabam afetando também o quadro econômico brasileiro”, argumenta.
Ainda na esteira das mudanças eleitorais, o líder do PSD na Câmara, deputado Antônio Brito (BA), pediu ao Colégio de Líderes que retome a discussão da proposta que altera o sistema eleitoral para o modelo distrital misto. A proposta a ser discutida é do ex-senador José Serra e está em tramitação na Câmara desde 2017.
O texto altera a regra para eleger deputados federais, estaduais, distritais e vereadores. O atual sistema proporcional seria alterado para o distrital misto, que combina regras do voto distrital (majoritário) com o voto em listas fechadas (proporcional).