A conjuntura atual da economia brasileira é sem dúvida muito alvissareira. Não há como negar que há bons números para se comemorar, mas há também muitos motivos para se preocupar. O PIB do segundo trimestre, que cresceu 1,4%, deixou evidente a robustez da demanda doméstica. O aumento da massa salarial, do crédito e das transferências de renda levaram a uma forte expansão do consumo das famílias.
A boa notícia é que esses três fatores vão seguir sustentando a expansão do consumo e os investimentos ao longo do 2º semestre deste ano. Não à toa, elevamos a revisão da projeção de crescimento da economia brasileira de 2,5% para 3,0% em 2024. Por outro lado, a trajetória do PIB levou a atividade a ultrapassar o nível de crescimento potencial. A implicação dessa dinâmica é que a continuidade do crescimento desse ponto em diante passará a pressionar mais claramente a inflação, visto que o limite de produção da economia brasileira foi superado.
Para que o Brasil seja uma economia pujante, sem que o fantasma da inflação nos assombre constantemente, não há receita mágica, é preciso olhar com cautela para as contas públicas
Mesmo com a deflação de agosto, é preciso um olhar atento sobre o que está por vir. Com a bandeira vermelha mantida até dezembro deste ano, por exemplo, há uma expectativa em relação à continuação dos custos elevados de energia, o que tem mexido com a projeção para o IPCA – revista de 4,5% para 4,7%.
Há quem discorde, mas o remédio amargo é a elevação da taxa de juros, ciclo já iniciado pelo Banco Central, que acaba de subir a Selic em 25 pontos base para 10,75% ao ano. O aperto não deve parar por aí. É provável que a autoridade monetária decida por mais dois aumentos de 50 pontos base nas duas últimas reuniões de 2024. Já no encontro de janeiro de 2025, é aguardado um avanço de mais 25 pontos— o que fará a Selic chegar aos 12% ao ano.
Mesmo com todos os percalços que acompanham uma trajetória de aperto monetário na economia brasileira, o início do ciclo de alta de juros pelo Banco Central contribui para a apreciação do real devido à redução do prêmio de risco relacionado à política econômica, o que nos fez revisar nossa projeção cambial de R$ 5,30 para R$ 5,20 por dólar ao final do ano. O início do ciclo de corte de juros nos Estados Unidos também já enfraquece o dólar frente às principais moedas e o real deve ser mais uma vez beneficiado. Porém, o orçamento para 2025 segue preocupante. O governo detalhou o corte de R$ 25,9 bilhões de gastos em 2025. No entanto, as medidas são de correção de fraudes e reorganização de gastos com programas sociais e não englobam medidas de médio prazo para conter o crescimento das despesas – como a discussão da desindexação das despesas.
Desta forma, seguimos avaliando como desafiador o cumprimento da meta de superávit primário tanto para 2024 quanto para 2025. Nossa expectativa é que o resultado primário seja deficitário em 0,6% e 0,8% do PIB em 2024 e 2025, respectivamente, bem diferente do que o governo tem projetado. Por fim, há diversas formas de se olhar para o cenário atual, a conjuntura da economia brasileira mostra uma atividade robusta, com o aumento do consumo das famílias e perspectivas de um câmbio mais valorizado. Do lado estrutural, a inflação e a falta de comprometimento com metas fiscais sustentáveis ofuscam o que há de positivo.
Para que o Brasil seja uma economia pujante, sem que o fantasma da inflação nos assombre constantemente, não há receita mágica, é preciso olhar com cautela para as contas públicas e entender que sem um olhar sustentável fiscal será difícil conseguir algum dia acabar com aquela sensação constante de que estamos nadando sempre contra a maré. Por enquanto, face à falta de soluções permanentes para os gastos públicos, o benefício da conjuntura favorável fica limitado pelo problema fiscal estrutural.
Luciano Costa é economista-chefe da corretora Monte Bravo.