O jurista Marlus Arns de Oliveira é candidato a presidente da seccional Paraná da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PR) pela placa de oposição “OAB Democrática”, no pleito da categoria com voto direto que ocorre em todo o país no próximo dia 22. No Paraná, os advogados Flávio Pansieri, da chapa “Pela Ordem 10”, e Luiz Fernando Pereira, da chapa “XI de Agosto”, também concorrem ao cargo.
Marlus Arns de Oliveira foi presidente da subseção da OAB de Curitiba entre 2004 e 2006 e, após o fim do mandato, disputou pela primeira vez a presidência da seccional do estado do Paraná. De acordo com ele, a chapa de oposição voltou a se organizar para eleição do comando da OAB-PR a partir de 2018.
“A oposição de forma organizada lança a chapa pela terceira vez neste ano. Uma oposição consolidada, viável e pronta para gerir adequadamente a OAB, que é comandada pelo mesmo grupo político desde 1977”, disse Marlus Arns de Oliveira em entrevista à Gazeta do Povo. As entrevistas com Flávio Pansieri e com Luiz Fernando Pereira foram publicadas na segunda (11) e na terça-feira (12), respectivamente.
Doutor e mestre em Direito pela PUC-PR, com estudos na Alemanha e nos Estados Unidos, Marlus Arns de Oliveira classificou a OAB como uma “instituição antidemocrática” pelo atraso nas eleições indiretas ao Conselho Federal, além da ausência de um processo eleitoral proporcional para garantir mais pluralidade nos assentos dos conselhos. O candidato também criticou a omissão na defesa da democracia e das prerrogativas dos advogados em casos como no inquérito das fake news e nas prisões do 8 de janeiro. Confira a entrevista na íntegra:
As eleições de entidades de classe são rotineiras, mas o pleito da OAB deste ano extrapolou os limites da classe profissional com acompanhamento atento do processo eleitoral pela opinião pública. Na avaliação do candidato, quais são as principais demandas da advocacia no país, entre elas, a defesa das prerrogativas e como essas posições repercutem no Estado Democrático de Direito?
O interesse da população, até dos próprios advogados, é baixo em relação ao pleito. A OAB transcende a importância das instituições políticas no país, foi uma das responsáveis pela redemocratização, lutou pelo (movimento) das “Diretas já”. A OAB encabeçou o impeachment do ex-presidente Fernando Collor. De um tempo para cá, a OAB deixou de ser ouvida, foi perdendo credibilidade, perdeu o espaço na sociedade e muito espaço em relação aos advogados.
Então, eu fico feliz que a percepção da Gazeta do Povo seja de que a eleição da OAB alcança outras pessoas além dos advogados e das advogadas, porque nós pretendemos devolver a OAB para os advogados e advogadas que compõem o órgão de classe. Também queremos devolver a credibilidade da OAB e a respeitabilidade perante as demais instituições públicas e políticas do país.
A escolha da diretoria do Conselho Federal da OAB ocorre por meio de votação indireta, o que é alvo de críticas dentro de um processo democrático. Por que isso ocorre e qual é papel ou influência das eleições seccionais para formação do Conselho e também nas eleições a presidente da OAB nacional em 2025?
Eu tenho dito que a OAB é uma instituição antidemocrática porque os advogados não votam para presidente do Conselho Federal e nossos Conselhos seccionais – ou seja, o Congresso, podemos assim dizer, de cada estado da federação – é eleito pela chapa vencedora, levando todas as cadeiras. Como se o governador do estado, ao se eleger, fizesse todos os deputados da Assembleia Legislativa.
Então, em 2006, quando nós lançamos pela primeira vez a chapa “OAB Democrática”, a bandeira da eleição direta para presidente do Conselho Federal já era defendida, além da bandeira da eleição proporcional para o conselho seccional, que é o congresso de cada OAB. Importante dizer que a proposta para presidente do Conselho Federal acabou sendo aceita por boa parte da advocacia, deixou de ser um tabu à época e a questão da proporcionalidade é defendida apenas pela nossa chapa. Esses dois são muito importantes na nossa visão.
O terceiro ponto é que cada chapa tem três conselheiros federais e três conselheiros suplentes, que representam a OAB Paraná perante o Conselho Federal, como se fossem os senadores. É fundamental que esses conselheiros estejam alinhados conosco e defendam a bandeira da nossa chapa, que é a eleição direta para presidente do Conselho Federal e a proporcionalidade porque isso depende de lei. Então, as eleições passam por uma votação desses conselheiros federais e que, pasmem os nossos leitores, os três titulares têm apenas um voto. Então, se houver divergência de votos, prevalece a maioria. É um sistema totalmente antidemocrático.
A hipertrofia atual do Judiciário com intromissão na seara de outros poderes entrou na pauta política do país. A crítica cunhou a expressão “ativismo judicial” com inúmeros casos questionados, principalmente no STF. Existem excessos na Justiça brasileira e como a OAB pode participar deste debate com o objetivo de garantir as liberdades do cidadão e direitos básicos, como ampla defesa e contraditório?
Nessa condição de falta de credibilidade, por ser gerida no Paraná pelo mesmo grupo político desde 1977, a OAB se afastou das críticas e, especialmente, da defesa das prerrogativas dos advogados. Nós temos profissionais que não têm acesso aos autos e são impedidos de sustentar oralmente. Isso acontece nos tribunais superiores em Brasília, mas também acontece nas delegacias de polícia, nos juizados especiais, na Justiça de primeiro grau, nos órgãos da Receita Estadual e da Receita Federal.
Nós agiremos imediatamente na defesa dos advogados sempre que tiverem as suas prerrogativas violadas. Isso é fundamental e a OAB precisa defender a prerrogativa do advogado. Ao fazer isso, ela está defendendo o cliente, o advogado, a população, o cidadão que está no Judiciário e acaba sendo prejudicado porque o advogado dele não tem acesso aos autos, não tem direito a fazer uma sustentação oral ou tem o exercício profissional agredido por uma autoridade. Isso não acontecerá na nossa gestão, pois teremos diretores regionais de prerrogativas, teremos uma prerrogativa desburocratizada para que todos os advogados sejam atendidos, imediatamente.
As prerrogativas dos advogados e acessos aos processos para defesa dos representados foram violados no país, em casos como o bloqueio de perfis nas redes sociais por críticas ao STF e também nos processos de defesa dos presos pelo 8 de janeiro? Qual a sua avaliação?
Nós defendemos um acesso pleno dos advogados aos autos e nessa questão do dia 8 de janeiro, temos muitas notícias de que os advogados não tiveram acesso aos autos, o que é fundamental. Na nossa gestão, vamos defender as prerrogativas dos advogados, fortalecendo o contraditório, a ampla defesa e o direito desses advogados. Reforço que isso não acontece só nas instâncias superiores, acontece também nas delegacias de polícia e nos fóruns.
Na minha caminhada por todo o estado do Paraná, nós temos ouvido inúmeras críticas e, para ter uma ideia de como a OAB tem falta de credibilidade perante os próprios advogados, uma boa parte que tem as suas prerrogativas violadas não denunciam para a OAB tomar providências. Segundo o censo da OAB, 46% dos advogados sequer denunciam essas violações de não acesso aos autos e outras tantas para que a OAB tome providências. Não denunciam porque não confiam que a OAB terá uma posição firme na defesa dos advogados.
Na questão das redes sociais, mencionada na pergunta, é preciso ter uma regulação para combater a disseminação de desinformação, combater o discurso de ódio e a manipulação. A liberdade de expressão é um pilar da democracia e o desafio é ter uma regulação clara e equilibrada que envolve a sociedade civil e especialistas em liberdade de expressão. A OAB deveria ser ouvida como parte da sociedade civil organizada.
A OAB teve participação e posicionamento enfático em momentos cruciais da defesa da democracia na história do país. O que mudou nos últimos anos para que a Ordem dos Advogados passasse a ser criticada por “preterição” na defesa das liberdades constitucionais, em casos como o vazamento das conversas de assessores do ministro Alexandre de Moraes no inquérito das fake news?
A OAB se omite de forma geral, não só aqui na seccional como no Conselho Federal. É importante dizer que a chapa da situação, que está no poder desde 1977, hoje se diz contrária ao inquérito das fake news, mas emitiram parecer há seis meses defendendo o inquérito para manutenção da ordem democrática.
Eu entendo que nós precisamos ter clareza, respeito às instituições democráticas e com isso fazer uma crítica sempre que tiver que ser feita. Por permanecer na mão do mesmo grupo político no Paraná e a OAB nacional por não ter eleições diretas, ambas acabam se acomodando e sendo omissas nestas respostas que precisam ser dadas.
A liberdade de expressão é um pilar da democracia e o desafio é ter uma regulação clara e equilibrada que envolve a sociedade civil e especialistas.
Marlus Arns de Oliveira, candidato à presidência da OAB-PR
O presidente da OAB, Beto Simonetti, declarou no final de maio pelas redes sociais: “Enquanto Ministério Público e juízes tiverem porte de arma, advogados também devem ter. Vamos debater o tema com as presidentes e os presidentes das seccionais para termos uma sensação da advocacia de cada estado”. Qual a opinião do candidato?
Nós temos uma proposta muito importante na nossa chapa que é de democracia direta. Grandes questões precisam ser resolvidas após ouvirmos toda a classe dos advogados. Na última gestão, tivemos a construção de um grande prédio e os advogados sequer foram ouvidos sobre a pretensão que se tinha para a utilização da verba.
Essa matéria [porte de armas], se vier para a OAB Paraná como uma demanda durante a nossa gestão, nós usaremos essa consulta direta para discutirmos com mais de 100 mil advogados do estado do Paraná. O atual grupo político nunca fez esse tipo de consulta porque, imagino, entenda que não é relevante. Nós implementaremos a consulta sempre que tivermos um ponto importante. Essa consulta se faz de forma eletrônica, a própria votação da OAB será eletrônica, da mesma forma é possível fazer uma consulta sempre que tiver uma grande questão para ser resolvida.
Dentro da garantia do direito pleno da prática profissional, como a seccional Paraná pode trabalhar em prol dos advogados paranaenses? Na eleição de âmbito estadual, quais são as demandas dos advogados do Paraná e o que pretende mudar na OAB paranaense, se for eleito?
Esse é o ponto principal da nossa plataforma porque a OAB Paraná tem competência para gerir os problemas dos advogados paranaenses. Nós temos um um grande material com as nossas propostas que estão no nosso site, nas nossas redes @oabdemocraticapr. Quero destacar a primeira proposta, que é de anuidade plena. Todos os serviços da OAB estarão inclusos dentro da anuidade. Hoje, os cursos da Escola Superior de Advocacia não estão incluídos na anuidade, precisam ser pagos. Na nossa gestão, estarão incluídos na anuidade. Se você fizer a carteira de advogado ou pedir certidões da OAB, você tem que pagar e isso não será mais cobrado pois estará incluído na anuidade.
Nós temos uma anuidade que é uma das mais caras do país, com o índice de inadimplência altíssimo de 41%. É preciso fazer campanhas para que os advogados estejam adimplentes com a OAB e que possam pagar a anuidade. Isso é fundamental. Nós buscaremos um reforço na caixa de assistência para todos que necessitarem, por exemplo, da licença-maternidade, que hoje é de R$ 1,5 mil. Nós ampliaremos essa licença, ao invés de uma parcela, para quatro parcelas. Assim, em cada área de atuação, os jovens advogados terão acesso a um tira-dúvidas em relação ao planejamento de gestão e financeiro para que possam prosperar na carreira.
Isso tudo precisa ser feito com esteio e discussão do Poder Executivo. Portanto, por exemplo, os dativos precisam ter o reajuste da tábua, que depende de lei estadual. Portanto, precisamos marcar reuniões com o governador do estado e com o presidente da Câmara para que, imediatamente, nós possamos trabalhar em uma legislação que traga um reajuste efetivo para os dativos no Paraná. Essas questões, mais as prerrogativas, são importantíssimas e temos ouvido essas demandas em todas as nossas visitas que temos feito no interno do estado e na capital.