Há 13 anos, em um momento de baixa no preço do café, alta nos insumos e áreas da lavoura infestadas de nematoides, o cafeicultor José Francisco Taufner se viu em uma encruzilhada. A indicação para reverter os prejuízos com a praga era aumentar os níveis de matéria orgânica no solo ou utilizar nematicida, o que elevaria ainda mais os custos.
Naquela época, o cafeicultor, que sempre se preocupou com as boas práticas agrícolas, resolveu produzir seu próprio biofertilizante para usar nos cafezais cuidados por ele e seus dois meeiros nos sítios da família, localizados no Córrego Mangangá, no interior de Santa Teresa (ES).
Abundante no município vizinho, Santa Maria de Jetibá, devido à produção de ovos, a principal matéria-prima utilizada pelo produtor era o esterco de galinha. Após a aquisição do produto de qualidade, com análise química e patológica, o mesmo era misturado com água e passava 30 dias descansando em toneis, para então ser aplicado na lavoura por meio da fertirrigação.
“Em pouco tempo observei resultados satisfatórios e, após um ano, a lavoura era outra, estava renovada”, conta o produtor.
Em 2020, orientado por um engenheiro agrônomo, Francisco começou adicionar microrganismos encontrados em material vegetal em decomposição, os chamados microrganismos eficientes (EM), no biofertilizante. Os EMs ajudam na liberação dos nutrientes do esterco de forma mais eficiente e aceleram o processo de produção, passando de 30 para, no máximo, 15 dias.



Arildo ao lado de Francisco e do casal de meeiros Nelson e Maria de Lourdes Oliveira, na área onde foi realizado o projeto
“Esses microrganismos, por meio de reações de fermentação, que ocorre durante o preparo do biofertilizante, produzem ácidos orgânicos, hormônios vegetais, vitaminas, e antibióticos que favorecem e desempenham importantes papéis no solo e nas plantas. Eles potencializam as propriedades biológicas na composição do biofertilizante e na absorção dos nutrientes pelas plantas”, explica o engenheiro agrônomo com mestrado em agroecologia, Arildo Sebastião Silva.
O especialista acrescenta que o que chama a atenção é o uso do biofertilizante como fonte de nutrição para plantas perenes, como o café.
“Essa receita com o uso do EM, desenvolvida pelo Francisco, é inovadora. Não temos estudos mais aprofundados, relacionados à nutrição de plantas focados em culturas perenes, utilizando apenas insumos orgânicos que você precisa repor nutrientes. O que mais se encontra são pesquisas para o uso do biofertilizante em culturas de ciclos curtos, de 45 e 60 dias, com raízes bem mais superficiais, em canteiros. O trabalho do Francisco abriu os olhos para o fato de que é possível trabalhar assim”, pontua o especialista.
Arildo atuou durante sete meses como bolsista no projeto intitulado “Produção de Alimentos Através dos Princípios Agroecológicos e seus Impactos nos Agroecossistemas”, desenvolvido na propriedade de Francisco para acompanhar o uso do biofertilizante na lavoura de café.
Os resultados preliminares do estudo indicam concentração de nutrientes como magnésio, fosforo, potássio, nitrogênio, entre outros, em quantidade que apontam que o biofertilizante é fonte alternativa sustentável e ecológica para nutrição das plantas, o que contribui para a redução do uso de fertilizantes químicos.
Dada a relevância dos resultados observados com o uso de biofertilizante na cultura do café, o próximo passo será a realização de uma pesquisa científica para avaliação do produto. A expectativa é que o Instituto Federal do Espírito Santo (Campus Santa Teresa), inicie os estudos ainda este ano.
O projeto que Arildo participou foi desenvolvido pelo Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper), com recursos da Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo (Fapes).
Produção orgânica
Satisfeito com os resultados alcançados, Francisco destaca a preservação do solo entre os benefícios do biofertilizante.
“Uma das grandes vantagens é a preservação da microbiota do solo, ou seja, mantém o equilíbrio, o que não acontece quando você faz uso dos produtos químicos. Quando você tem esse equilíbrio você reduz as pragas e as doenças”.
Francisco disse ainda que em Santa Júlia, distrito de Santa Teresa, já tem produtores fazendo uso do biofertilizante. “Eu fico muito feliz de ver mais gente aproveitando os insumos que a gente tem aqui na porta de casa, que é Santa Maria. Nós temos estercos de galinha poedeira de 10 a 12° de umidade, com os elementos altíssimos e sem odor”.
Mesmo antes do biofertilizante, Francisco já implementava ações de preservação ambiental na propriedade. Itens como conservação do solo e dos mananciais, bem como o armazenamento de água, sempre foram práticas presentes.
Com a ajuda do Incaper de Santa Teresa ele buscou iniciativas para reduzir também o uso de agrotóxicos. Para isso, deu início à produção e uso da calda sulfocálcica, produto benéfico à lavoura por seu poder inseticida, fungicida, acaricida, virucida, importante para o combate a cochonilha, além de reduzir os custos.
“Nós ainda jogamos alguma coisa de químico na lavoura, muito pouco, para combater a cochonilha. Já não usamos mais calcário em nosso cafezal há muito tempo. Isso reduz os nossos custos e nos deixa tranquilos com o preço do café, por exemplo. Gastamos muito pouco com a manutenção da lavoura, então, mesmo que o café caia de preço, não temos prejuízo”, pontua.