por Anne Dias Ser ministro do Supremo Tribunal Federalista deveria ser sinônimo de seriedade, discrição e compromisso com a Constituição. Mas, no Brasil, essa função se transformou em um espetáculo. O STF
há tempos extrapola suas competências, legislando por conveniência e tomando decisões guiadas por interesses pessoais e ideológicos. Agora, a transformação de uma ministra em notoriedade, com recta à participação em programas de entretenimento, representa o vértice desse processo de banalização de uma das instituições mais importantes do país. No domingo retrasado, no tradicional “Amigo Secreto” doFantástico
que anualmente reúne as principais celebridades do país, a ministra Cármen Lúcia foi uma das convidadas. Durante a troca de presentes, ela recebeu uma imagem de Nossa Senhora Aparecida de um cantor sertanejo e presenteou seu colega secreto com um réplica da Constituição brasileira.
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O gesto não poderia ser mais contraditório. Porquê ministra do STF, Cármen Lúcia deveria zelar pela força e seriedade das instituições, conforme estabelece a própria Constituição que ela escolheu presentear. No entanto, ao participar de um programa de entretenimento, ela enfraquece a percepção pública da instituição que representa.
Além de Cármen Lúcia: outros ministros gostam de holofotes Vale lembrar que a ministra não foi a primeira a se expor de maneira inadequada. Em outra ocasião, o ministro Luís Roberto Barroso também abandonou o decoro esperado de um membro do Supremo ao participar de uma entrevista no programaConversa com Bial da GNT. Da mesma forma, o ministro Gilmar Mendes já concedeu entrevistas a programas uma vez que oConduto Livre
da Band. Ambos supostamente foram para esclarecer questões judiciais. No entanto, questões judiciais devem ser esclarecidas nos autos, e não na prensa. E os absurdos não param por aí. Nesta mesma semana, Gilmar Mendes
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Os ministros Gilmar Mendes (à esq) e Luís Roberto Barroso (à dir), durante sessão plenária | Foto: Lula Marques/Dependência PT O problema vai muito além da mera exposição pública. Quando ministros do Supremo
escolhem se colocar sob os holofotes, surge o risco de que suas decisões, que deveriam ser fundamentadas exclusivamente na lei, na princípio e na jurisprudência, passem a ser influenciadas por critérios de popularidade. A função de um ministro do STF exige, supra de tudo, coragem para tomar decisões que muitas vezes contrariam a opinião pública. Diferentemente do Legislativo, que existe para simbolizar os anseios da população, o papel dos ministros é exclusivamente jurídico. Eles não foram eleitos para aprazer a maioria, mas sim escolhidos para interpretar e impor a Constituição com independência e imparcialidade. No entanto, quando a imagem de um ministro começa a ser amplamente pública, eles podem permanecer mais inclinados a determinar de forma a aprazer a opinião pública ou preservar sua popularidade, comprometendo a independência e a seriedade de suas funções.
O risco de transformar ministros em celebridades
Um exemplo evidente dessa inclinação foi o incidente envolvendo o julgamento sobre a reeleição dos presidentes da Câmara e do Senado em 2020. Na ocasião, os ministros Luiz Fux e Luís Roberto Barroso inicialmente sinalizaram que votariam em prol da possibilidade de reeleição de Davi Alcolumbre, logo presidente do Senado. Mas, depois de receberem duras críticas da opinião pública e da prensa durante o final de semana, ambos mudaram seus posicionamentos.
Se queremos edificar um país sério, precisamos ser intransigentes na exigência de instituições sérias. Ministros que escolhem protagonizar espetáculos midiáticos, comprometendo a credibilidade de suas funções e banalizando a influência do incumbência, devem ser firmemente criticados pelos formadores de opinião. Caso contrário, essa procura por popularidade continuará a comprometer a independência do Judiciário e a fomentar a suspicácia de uma população que já vê o Supremo com ceticismo.
Anne Dias é advogada, formada pela UFPR. Diretora do Lola Internacional (Ladies of Liberty Alliance, uma rede mundial de mulheres liberais e libertárias) e presidente do Lola Brasil.
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