Por Daniela Klein e Michel Tesch
O agronegócio brasileiro raramente é convocado a ser protagonista nas grandes negociações sobre clima. Com frequência, ele é citado como problema ou, no máximo, como variável a ser ajustada, o que distorce a realidade técnica e compromete o alcance de soluções sustentáveis com escala. O Brasil é um dos únicos países capazes de produzir alimentos em grande quantidade, conservar a biodiversidade e, ainda, reduzir emissões e sequestrar carbono. Mas isso exige uma mudança de perspectiva: o agro precisa deixar de ser tema de nota de rodapé para se tornar sujeito da conversa climática.
Na trilha do agronegócio da Conferência Sustentabilidade Brasil 2025, etapa da agenda da COP 30, esse reposicionamento é visto como estratégico e faz uma proposta onde o agro não precisa ficar na defensiva. Não se busca isenção ou aplauso para o agro, mas se coloca em pauta a possibilidade concreta do setor participar da conversa como um dos mais importantes agentes de transição, articulando produtividade sustentável, justiça territorial e restauração ambiental.

A trilha pretende mostrar que o agro está em tudo. Conecta com a inovação tecnológica e com a política pública, com o consumo consciente e com a comunicação de valor, com o mar e com a terra, com a floresta e com a cidade. É o ponto de encontro entre cadeias econômicas e sistemas naturais, entre a lógica de mercado e a soberania alimentar. E, por isso, aparece ao longo da conferência costurando diálogos entre diferentes trilhas, sem perder identidade.
A sustentabilidade nas cadeias agroalimentares precisa estar ancorada em políticas públicas permanentes, no reconhecimento da diversidade de produtores e na conexão entre práticas regenerativas e decisões de compra. O agro regenerativo não nasce apenas da vontade individual, mas de uma ambiência institucional que permita acesso a crédito, assistência técnica e mercados com critérios claros e
justos. E precisa ser um dos protagonistas dessa construção, um anfitrião do debate.
No Espírito Santo, essa ambiência vem sendo construída por meio de iniciativas que combinam governança territorial e inovação. Programas de preservação hídrica, integração entre agricultura familiar e mercado externo, estratégias para as diversas cadeias produtivas e projetos de recuperação de áreas degradadas são exemplos práticos de um agro que dialoga com a agenda climática sem perder eficiência. E isso tem sido percebido por diversas comitivas internacionais que têm vivenciado a transformação sustentável na prática, e passam a citar o Estado como uma referência para o Brasil e para outros países.
Ao longo dos cinco painéis da trilha, o setor é abordado a partir de múltiplas camadas. Essa é, talvez, a principal contribuição da trilha agro: romper a lógica de caixinhas estanques e evidenciar que as respostas climáticas precisam ser integradas. Não há como debater economia azul sem falar de pesca artesanal e cadeias alimentares. Não há como debater competitividade sem analisar as exigências ambientais do mercado internacional. Não há como debater inovação se ela não estiver disponível para o pequeno produtor. E não há como debater reputação se os dados não forem traduzidos em confiança pública.
O agro que estará no Sustentabilidade Brasil não é uniforme, é plural, técnico e disposto a dialogar com complexidade. Há de se reconhecer desafios históricos, mas também enxergar o acúmulo de aprendizados institucionais e soluções replicáveis que já foram conquistadas e entender, de uma vez por todas, que a transição ecológica não será feita à revelia do campo, e que o alimento que chega à mesa precisa ser parte da equação climática desde a origem.
Não há transição justa possível que exclua o rural da mesa de negociação. E não há caminho climático consistente sem incluir o agro como parte da resposta.