A aprovação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) pela Assembleia Legislativa do Paraná (Alep) terá um capítulo a parte em 2025 após o governo Ratinho Junior (PSD) incluir a limitação de percentual para o repasse nos orçamentos da Justiça e do Legislativo para o próximo ano. O texto – que prevê a receita total de R$ 82,9 bilhões – impõe um teto para as despesas com pessoal, o que pode ser interpretado como uma tentativa de frear os “supersalários” no funcionalismo público, principalmente no Judiciário, no Ministério Público (MP) e no Tribunal de Contas, onde os vencimentos são turbinados pelo pagamento dos penduricalhos.
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De acordo com o projeto de lei encaminhado aos deputados estaduais pelo governo Ratinho Junior, os recursos destinados serão delimitados em 5% ao Poder Legislativo; 1,9% ao Tribunal de Contas do Estado (TCE); 9,5% ao Poder Judiciário; 4,2% ao MP e a R$ 148 milhões para Defensoria Pública. A LDO de 2026 autoriza o Executivo a abrir créditos suplementares nos orçamentos dos demais poderes.
A proposta paranaense ainda limita as despesas com pessoal em 3% no Legislativo e no Tribunal de Contas; 6% no Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR); 2% para o MP e 49% para o Executivo. A reação imediata das autoridades representantes dos órgãos dos três poderes foi procurar o governo do Paraná para tratar do assunto em reuniões, o que sinaliza que Ratinho Junior deve enfrentar resistência se apostar na aprovação da medida de contingenciamento.
No ano passado, o governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), apresentou a LDO de 2025 com déficit de R$ 8 bilhões e propôs um série de cortes no repasse aos poderes. Houve resistência por parte do Judiciário e a aprovação do projeto de lei travou na Assembleia Legislativa mineira.
Ao invés da redução, os magistrados chegaram a pleitear um aumento de 21% no repasse do Executivo para o orçamento do TJ de Minas Gerais. Um substitutivo foi aprovado nas últimas sessões do ano passado pelos deputados estaduais com alteração nas despesas dos tribunais de Justiça e de Justiça Militar, contemplando os valores aprovados pelo Poder Judiciário.
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- 4 Repasse para poderes supera inflação e áreas como saúde, educação e segurança
Em 2023, o estado do Ceará chegou a aprovar o limite orçamentário durante votação na Assembleia Legislativa, mas o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Fux derrubou o teto de gastos com pessoal para Judiciário e Ministério Público. A ação foi apresentada pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e a Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp) contra a medida na LDO 2024, que previa limitar gastos com folha suplementar a 1% da folha normal de pagamento.
Fux considerou a lei estadual inconstitucional pela imposição unilateral da restrição orçamentária, o que violava a autonomia financeira das duas instituições. Neste ano, outro governador que propôs o limite orçamentário foi Ronaldo Caiado (União Brasil), mas o projeto goiano não inclui o Poder Judiciário e o Ministério Público na medida para frear o custo com as folhas de pagamento.
Segundo a LDO 2026, encaminhada para apeciação da Assembleia Legislativa de Goiás (Alego), o texto estipula um percentual da arrecadação para as despesas de pessoal no Legislativo e nos Tribunais de Conta. O percentual é de 1,5% para Alego e fixou em 1,35% para o Tribunal de Contas do Estado de Goiás (TCE-GO). O Tribunal de Contas dos Municípios do Estado de Goiás tem o menor teto de gastos, com 0,55%.
Em São Paulo, a LDO 2026 encaminhada pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) não apresenta um limitador percentual, mas prevê que medidas devem ser tomadas pelos poderes com base na Lei de Responsabilidade Fiscal, se for apurada a despesa corrente a partir de 85% em relação à receita no período de 12 meses. Por outro lado, a Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) aprovou na última quarta-feira (7) um pacote de três projetos com benefícios ao Tribunal de Contas do estado paulista, que deve ter um impacto de cerca de R$ 110 milhões no orçamento até o fim de 2026.
As matérias aprovadas criam 55 novos cargos, um bônus de até R$ 264 mil para quem antecipar a aposentadoria após 20 anos de carreira e ainda reajustam em 98% os salários de funções que tiveram as nomenclaturas alteradas por um projeto de lei. No final de abril, a Assembleia Legislativa do Paraná também aprovou a criação de 21 cargos comissionados no TJ-PR, que terá um impacto de R$ 5 milhões por ano no orçamento do Judiciário.
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“Supersalários”: conselheiro substituto tem rendimento de R$ 413 mil em abril
Segundo informações do Portal da Transparência, um conselheiro substituto do TCE do Paraná teve um rendimento líquido de R$ 413 mil, sendo que o salário-base para o cargo é de R$ 39.753,91. A legislação permite o pagamento dos penduricalhos, além do teto constitucional, o que possibilita os “supersalários” no Judiciários e em órgãos como Tribunais de Contas e Ministérios Públicos estaduais.
O teto constitucional é previsto com base no salário de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), hoje fixado em R$ 46,3 mil. Segundo o levantamento da Gazeta do Povoo conselheiro do TCE-PR recebeu R$ 381 mil relativos a férias, licenças e quinquênios (benefício por tempo de serviço) no mês de abril. O Tribunal de Contas também teve o segundo maior rendimento entre os poderes com vencimento de R$ 211 mil pago a outro conselheiro substituto, sendo que R$ 178 mil são referentes a férias, licenças e quinquênios.
No mês passado, a média de rendimento dos desembargadores do Tribunal de Justiça do Paraná foi de R$ 76 mil, acima do teto constitucional. O valor mais alto pago para um desembargador do TJ-PR foi de R$ 116 mil. Além disso, o levantamento da Gazeta do Povo localizou 198 procuradores e promotores paranaenses do Ministério Público com rendimentos, em abril, entre R$ 50 mil e R$ 76 mil.
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Legislativo e Judiciário vão discutir orçamentos com Ratinho Junior
Procurada pela Gazeta do Povoa Assembleia Legislativa reiterou que a LDO de 2026 chegou à Casa com alterações importantes em relação aos anos anteriores, entre elas, a criação do teto no repasse para os Poderes Legislativo e Judiciário, além do Tribunal de Contas e do Ministério Público. “Por ser previsão nova os Poderes foram surpreendidos e necessitam calcular o impacto da nova LDO em cada uma de suas propostas orçamentárias. Com isso, decidiram criar um grupo de trabalho para analisar cada uma das alterações, bem como reivindicar uma reunião com o Poder Executivo para tratar do assunto”, afirma.
Segunda a nota da Alep, os técnicos dos diferentes órgãos estão sendo chamados, separadamente, para discussões do tema com o corpo técnico da Secretaria de Fazenda. “A equipe da Assembleia Legislativa já participou desta reunião e sentiu que o Governo do Estado está sensível e disposto a dialogar na busca de uma LDO consensual. Paralelamente, os chefes dos Poderes também estão em constante contato”, comenta.
O projeto de lei está na Comissão do Orçamento e a previsão é que o prazo para emendas deve ser aberto na segunda quinzena deste mês de maio. “A Assembleia Legislativa do Paraná confia em uma solução de consenso, na certeza de que não existe política pública sem a cooperação entre os poderes”, completa a nota da Alep.
A medida é considerada popular até por parlamentares que integram a oposição, no entanto, é classificada nos bastidores como “eleitoreira” como parte do projeto nacional do governador Ratinho Junior, que pretende disputar as eleições presidenciais em 2026. Deputado estadual de oposição, Requião Filho (PDT) defendeu a regulamentação dos orçamentos para além do teto constitucional, mas classificou a medida do governo paranaense como um “teatro”.
“Será uma limitação de fato ou o governador só está organizando a fila de quem baterá em sua porta pedindo mais dinheiro em créditos complementares?”, provoca.
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Repasse para poderes supera inflação e áreas como saúde, educação e segurança
No Paraná, a Secretaria de Estado da Fazenda (Sefa) justifica que a criação do “limitador para o crescimento dos gastos públicos” tem o objetivo de assegurar que os recursos sejam destinados para áreas prioritárias. De acordo com a secretaria estadual, o repasse aos poderes registrou um aumento de 75% entre 2021 e 2025, sendo que a inflação no período foi de 35%.
“Essa disparidade, segundo o governo, resultou em um crescimento superior ao destinado a áreas essenciais como saúde, educação e segurança pública”, aponta a Sefa, em nota. A Fazenda afirma que a meta é “uniformizar” os gastos em 9,2% para todos os poderes, o que representa uma redução na participação no orçamento do governo do Paraná, que atualmente é de 12,3%.
“O Estado mantém diálogo permanente com os Poderes e tem construído junto aos órgãos de fiscalização uma proposta que não implique em redução de recursos para nenhum deles, mas sim em um crescimento limitado e mais equitativo”, declara a pasta. Procurado pela Gazeta do Povo, o TCE-PR respondeu que deve aguardar a discussão com o Executivo para se manifestar.
O TJ-PR disse que não irá comentar o assunto. Já o MP-PR demonstra preocupação com a limitação do orçamento atrelado à inflação mais ao PIB brasileiro do ano passado. “O MP-PR alerta para o risco de que essa medida comprometa sua autonomia e capacidade de atuação na defesa dos interesses da sociedade. A alegação de crescimento dos repasses nos últimos cinco anos e a menção a recursos em caixa ao final de 2024 demandam análise específica, considerando as necessidades e a destinação dos valores empenhados”, declara o Ministério Público.