O Tribunal Supremo Federal (STF) concluiu, na última terça-feira, 11, o julgamento no qual decidiu ampliar o alcance do foro especial. A nova interpretação amplia a competência da Corte, antes restrita a crimes cometidos durante o mandato e em razão dele.
Os ministros justificaram que a decisão visa fechar uma brecha que permitia aos acusados manipular o órgão responsável pelo julgamento de seus processos, por meio da possibilidade de renúncia. Ao longo dos anos, o tema foi objeto de diversas reinterpretações no STF, o que gerou um cenário de incerteza jurídica.
Com um placar de 7 a 4, o caso foi relatado pelo ministro Gilmar Mendes. Os ministros André Mendonça, Edson Fachin, Cármen Lúcia e Luiz Fux foram derrotados pela maioria.

O foro por prerrogativa de função, chamado também de foro privilegiado, tem respaldo constitucional e garante que algumas autoridades públicas sejam julgadas por tribunais superiores. O objetivo é evitar pressões que poderiam surgir em instâncias inferiores.
Por esse motivo, parlamentares são julgados pelo STF, prefeitos pela segunda instância e governadores pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). A Constituição define quais autoridades têm foro privilegiado, mas não especifica exatamente qual deve ser a interpretação desse dispositivo, o que abre margem para mudanças recorrentes no STF sobre o tema.
Há duas principais regras que orientam a aplicação do foro especial. A primeira, relacionada à natureza do crime, trata da conexão entre o delito e as funções do cargo. A segunda, sobre a atualidade, observa a simultaneidade entre a prática do crime e o exercício do mandato.
▶️Ações contra autoridades permanecem no @STF_Oficial mesmo após saída do cargo. Por maioria, o Plenário seguiu o voto do ministro @GilMmendespara quem a nova posição estabelece critério geral mais abrangente e aperfeiçoa o atual entendimento da Corte: pic.twitter.com/calrjq9qtg
— STF (@STF_oficial) 12 de março de 2025
Última decisão do STF sobre foro especial foi em 2018
A decisão mais recente sobre o assunto foi expedida em 2018, no contexto da Operação Lava Jato. Naquela época, críticos do modelo afirmavam que o foro privilegiado dificultava investigações, o que contribuía para a impunidade.
A partir do julgamento de uma questão de ordem na ação penal 937, o Supremo restringiu a própria competência em casos com foro especial. A Corte passou a considerar que os acusados deveriam estar no cargo quando o processo fosse instaurado e que o posto tivesse relação com o crime cometido.
Segundo essa interpretação, se um deputado federal fosse investigado por um crime relacionado ao período de um mandato como prefeito, o caso não seria da competência do STF. Da mesma forma, se o deputado fosse processado no STF, mas perdesse o cargo antes da conclusão do julgamento, o caso seria transferido para a primeira instância.


Interpretações mais restritivas do foro especial podem aliviar a sobrecarga dos tribunais, o que, de fato, aconteceu depois da mudança de 2018. Dados de 2022 indicam que o número de ações penais e inquéritos no STF caiu 80% em comparação com o período anterior à alteração da norma.
Agora, com a ampliação da regra, a competência do Supremo será mantida mesmo depois de os acusados deixarem os cargos que originaram o foro especial. Dessa forma, não será mais possível que o processo seja transferido para outro tribunal por meio de renúncia ou perda do mandato. No caso de um deputado federal processado no STF, por exemplo, o processo continuará na Corte mesmo diante do fim de seu mandato.
Além disso, a abertura de inquéritos e ações penais poderá acontecer mesmo se o investigado ou acusado deixar o cargo.


Um caso emblemático é o de Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara. Em dezembro, o ministro Gilmar Mendes declarou a competência do STF para julgar Cunha em um processo sobre corrupção. O ministro disse que os fatos apurados tinham relação direta com o exercício do seu mandato, apesar de Cunha não ser mais deputado desde 2016.
A decisão do STF terá impacto também em outros tribunais que julgam processos de foro especial.