Giorgia Meloni, primeira-ministra da Itália, fez uma polêmica proposta ao Parlamento Europeu, sugerindo que Roma se tornasse a capital da União Europeia. A escolha, no entanto, não seria apenas simbólica: Meloni defende que as principais instituições da UE sejam transferidas para a “Cidade Eterna”, substituindo Bruxelas, atualmente o centro administrativo da União, além de Estrasburgo e Luxemburgo.
A proposta gerou grande repercussão, mas não é descabida. Roma é considerada o coração da Europa Ocidental, devido ao seu papel como centro do Império Romano, que unificou vastos territórios e disseminou a cultura greco-romana, estabelecendo as bases políticas, jurídicas e culturais da Europa. A cidade também é o berço do Cristianismo, sendo sede da Igreja Católica desde a Antiguidade, consolidando sua influência ao longo da Idade Média e da era moderna. A fusão da herança greco-romana com o Cristianismo tornou Roma um pilar da civilização ocidental, com o Cristianismo ainda sendo a principal religião da Europa.
Historiadores como Peter Brown, professor emérito da Universidade de Princeton, discutem a importância de Roma como o centro histórico e cultural da Europa. Brown argumenta que Roma foi crucial na formação da identidade europeia, tanto pelo seu legado político e jurídico quanto pela sua conexão com o Cristianismo, que se tornou a base espiritual da Europa medieval e moderna.
A analogia entre a multiculturalidade europeia e a formação do povo italiano é pertinente, especialmente quando se considera que Roma, com sua rica herança histórica, poderia ser considerada a capital simbólica da Europa. Assim como os povos europeus se formaram ao longo de um complexo processo de integração e troca cultural, a formação do povo italiano também reflete um longo caminho de fusões e influências. A localização estratégica da península Itálica no centro do Mediterrâneo fez dela um ponto de encontro de diferentes civilizações.
Roma, com sua rica herança como centro do Império Romano e berço do Cristianismo, é o símbolo perfeito da identidade que unifica o continente, e sua centralidade histórica reforça a ideia de que a cidade tem a legitimidade e o poder para abrigar as instituições da UE
Roma unificou a península sob seu domínio, impondo uma identidade cultural baseada no latim, na arte, filosofia e arquitetura gregas e nas estruturas políticas e militares romanas. A expansão do Império Romano trouxe consigo uma diversidade étnica sem precedentes, integrando povos celtas, germânicos, ibéricos e norte-africanos. Mesmo após a queda do Império Romano, o Cristianismo e a força da Igreja Católica mantiveram uma identidade comum entre os povos, apesar da fragmentação política. O latim, base da língua italiana, também fundamenta a maioria das línguas faladas na Europa, como o português, espanhol, francês, romeno e catalão, reforçando a ideia de Roma como centro cultural e religioso do continente.
Recentemente, Giorgia Meloni reiterou sua posição, afirmando: “Roma deveria ser a capital da União Europeia, porque a capital da União Europeia não pode ser o lugar mais conveniente para instalar escritórios, mas sim o lugar que representa sua identidade milenar”. O contexto atual favorece Giorgia Meloni. A instabilidade política em países vizinhos, como a Alemanha, que viu o parlamento derrubar o chanceler Olaf Scholz, e a França, onde Emmanuel Macron enfrenta forte rejeição popular, abre espaço para Giorgia Meloni se consolidar como uma figura central na política europeia. Mesmo a Bélgica, que abriga Bruxelas, enfrenta turbulências com um governo em transição após a renúncia do primeiro-ministro e uma polarização crescente entre os cidadãos.
Meloni também mantém alianças estratégicas fora da Europa, especialmente com o presidente dos EUA, Donald Trump, que, durante um encontro recente, declarou: “Estou aqui com uma mulher fantástica, a primeira-ministra da Itália. Ela realmente conquistou a Europa”. Esse apoio a coloca em uma posição privilegiada de interlocução com líderes europeus. O jornal Times financeiros publicou um artigo destacando Giorgia Meloni como uma possível mediadora entre Trump e a Europa. Similarmente, a Reuters discutiu como ela está gerenciando sua relação com Trump, consolidando-se como uma figura central nas relações intercontinentais.
Vale destacar o progresso econômico da Itália sob a liderança de Meloni. Segundo o The New York Timeso governo reduziu os gastos estatais, incentivou exportações de tecnologia e produtos automotivos, e atraiu novos investimentos estrangeiros. Grandes empresas globais, como a Microsoft e a Amazon, escolheram a Itália como destino estratégico, com investimentos significativos no país.
As críticas à proposta de Giorgia Meloni de transferir a sede da União Europeia para Roma incluem preocupações com os custos financeiros envolvidos na mudança de infraestrutura. Bruxelas é considerada uma escolha estratégica por sua neutralidade e localização central, e a mudança poderia comprometer a eficiência administrativa da União, já que a cidade já tem a estrutura necessária para abrigar as instituições da UE.
Outros críticos veem a proposta como uma tentativa de Meloni de fortalecer a posição da Itália na União Europeia. A mudança poderia ser vista como um movimento nacionalista, gerando desconfiança e resistência de outros estados membros que temem que a decisão seja motivada por interesses políticos e não pela unidade europeia.
Meloni é frequentemente rotulada como uma líder de “extrema-direita”, especialmente por sua defesa de valores tradicionais, como a proteção da família e sua oposição a políticas ditas “progressistas”. Contudo, no que diz respeito à imigração, Giorgia Meloni pode encontrar ressonância entre líderes de outros países europeus. A crescente insatisfação com os efeitos da imigração descontrolada, tanto econômicos quanto culturais, tem levado governos a adotar políticas mais rígidas. Há sinais claros de que a Europa caminhará para um controle migratório mais rigoroso nos próximos anos, e Meloni, com sua postura firme, pode se consolidar como porta-voz dessa tendência e fortalecer o plano de mudança da capital da UE
Roma, com sua rica herança como centro do Império Romano e berço do Cristianismo, é o símbolo perfeito da identidade que unifica o continente, e sua centralidade histórica reforça a ideia de que a cidade tem a legitimidade e o poder para abrigar as instituições da UE. Além disso, a mudança poderia promover maior coesão entre os países membros, ao reforçar a ideia de um espaço comum que vai além das questões administrativas e econômicas, focando na história e nos valores que realmente moldaram a Europa moderna.
Em um momento de instabilidade política e desafios econômicos, a transferência da capital para Roma poderia ser um passo simbólico e prático para revitalizar o projeto europeu, dando à Itália um papel de liderança mais destacado, não apenas no sul, mas no coração da Europa. Assim, a proposta de Giorgia Meloni não é apenas uma questão de realocação de poder, mas uma chance de fortalecer os laços históricos e culturais que ainda unem os países da União Europeia.
Dimitrios Elias Grintzos é engenheiro civil e filósofo.