Virginia Burton tinha quatro anos quando viu o pai pela última vez. Viciado em drogas e traficante, ele foi recluso e nunca mais deu notícias. “Eu sabia que entorpecentes não eram bons, porque tinham tirado ele de mim. Mas eles eram a realidade que eu conhecia”, relata. Quando Virginia tinha sete anos, sua mãe, também dependente, a convenceu a fumar maconha.
Desde aquele momento, Ginny, porquê é conhecida, se envolveu em uma lesma cruel, marcada por vício, abusos e uma vida marcada pela criminalidade. Hoje ela tem 52 anos. E comemora, na entrevista concedida por telefone à Publicação do Povo em 9 de janeiro: “Estou sóbria há 12 anos, um mês e três dias. Meus filhos foram criados pelo Estado. Mas estive presente no nascimento do meu neto de 10 anos e desde então participei de toda a vida dele”.
Agressões e prisões
Nascida em Tacoma, no estado de Washington, em 1972, Ginny demorou para entender que não vivia em um contexto familiar normal. Foi só depois do sumiço do pai e das primeiras experiências com a mãe que ela começou a compreender que aquele envolvente não se repetia na maior secção das casas. Estudante dedicada, que tirava boas notas na escola, ela viu diferentes homens entrarem em sua lar para comprar ou vender drogas. Sofreu estupros e agressões físicas. “Comecei com maconha e álcool, escalei para metanfetamina e cocaína e, perto dos meus 20 anos, heroína”. Com 12 anos, foi presa pela primeira vez.
A partir do momento em que a heroína entrou na sua vida, a situação ficou ainda pior. Quando não estava detida, Ginny vagava pelas ruas agredindo e roubando. “Eu era violenta, roubava pessoas. Neste intervalo, tive filhos”. Foram três crianças, que sofreram as marcas do histórico familiar. A primeira, o único menino, não conheceu o pai, assassinado ainda durante a gravidez. O rebento de Ginny acabaria cometendo suicídio aos 32 anos, dentro da lar da mãe. A segunda filha mantém contato com Ginny, mas o pai está recluso. Ele cumpre pena perpétua. A terceira e mais novidade vive com a mãe atualmente. “Os maridos das minhas duas filhas foram assassinados, um deles com um tiro na cabeça em 2023”, conta.
“Enquanto as crianças cresciam, eu seguia usando drogas, tentando ser mãe e falhando miseravelmente em tudo. Eu sabia que não queria ser assim, mas não sabia como mudar. Todas as pessoas à minha volta, ao longo da minha vida, eram viciadas em drogas”.
Depois de ser presa novamente, aos 38 anos, ela decidiu mudar de vida. Não conseguiu. “Fui morar com um homem, meu segundo casamento. Rapidamente ele se tornou muito violento e eu voltei às drogas. Minha mãe morreu na mesma época, o que contribuiu para minha falta de controle. Voltei a cometer crimes e fui presa novamente aos 40 anos”.
E foi só logo que ela chegou ao ponto de transformação. “A minha última experiência usando drogas foi tão caótica e traumática que me permitiu dizer: ‘Não posso mais continuar fazendo isso’. Eu desejava ser morta, e acabei sendo presa. Esta foi a oportunidade de mudar de vida, me reconstruir de dentro para fora, longe daquele ambiente em que eu vivia”. Na ocasião, ela roubou um caminhão, foi perseguida pela polícia, tentou arrojar o veículo contra uma árvore, mas não conseguiu. Ao ser detida, olhando para as algemas em suas mãos, sentiu-se aliviada – e decidida.
“Eu sabia que precisava parar de usar drogas. A pessoa que eu via no espelho era alguém que eu não respeitava. Eu precisava me transformar, e então comecei esse processo. Entendi que não importava mais tudo o que tinha acontecido, todas as vezes que eu tinha sido presa. Eu podia melhorar”. Pediu, e conseguiu, o recta de passar por um programa de recuperação do vício enquanto estava detida. E desde logo participa ativamente do Narcóticos Anônimos. É madrinha de muitos viciados em recuperação
Quotidiano ingénuo
Desde 2010, quando começou a buscar um novo rumo para sua vida, Ginny criou uma conta no Facebook, e a deixou pública. “Em alguns momentos da minha vida, atuei como voluntária, lendo notícias e livros para outras pessoas. Contar histórias é muito importante. E eu percebi que precisava compartilhar todo o meu passado. Não deixo nada de fora. Não criei meus filhos, então usei as redes sociais para tirar dúvidas e apresentar minhas dificuldades”. Num primeiro momento, o objetivo era depreender as pessoas que antes faziam secção de seu círculo de viciados. Mas rapidamente a interação alcançou pessoas que ela não conhecia.
“Quero ajudar a maior quantidade possível de pessoas. Eu passei por experiências terríveis, violência doméstica, muitas agressões sexuais. Tento alcançar a maior quantidade possível de pessoas que experimentam situações semelhantes, para que elas saibam que é possível mudar”.
E foi neste contexto que, em 2021, ela publicou uma montagem de duas fotos, uma de 2005, no auge do vício, e outra no dia de sua formatura pela prestigiada Universidade de Washington, onde conseguiu uma bolsa disputada que permitiu que ela, já perto dos 50 anos, concluísse com méritos sua graduação. O objetivo era mostrar o poder da mudança que ela havia conquistado. Mas rapidamente a imagem se tornou viral e ela passou a conceder entrevistas para diferentes veículos, impressos e televisivos. A imagem ainda hoje é medial em suas mídias sociais, porquê a conta no Instagram.
Trabalho social
Ginny é uma entrevistada generosa e franca, que não omite detalhes sobre sua própria história. Ela tem um objetivo simples com esta postura: transformar seu pretérito tão difícil em exemplo para outras pessoas, mas também mudar a forma porquê o poder Judiciário e a assistência social americana lidam com os viciados em drogas.
“Na minha experiência, os profissionais da área não entendem os viciados e não conseguem ajudá-los, de fato, a abandonar os entorpecentes. Tenho um programa dentro das prisões que me permite entrar em contato diretamente com pessoas que passam por tudo o que eu já passei e não entendem que têm o poder de se transformar”.
Hoje, Ginny ela vive em Olympia, capital do estado de Washington. Ela segue publicando textos sobre sua rotina – que, aliás, começa, ainda na leito, com reflexão e agradecimentos por tudo o que ela conquistou e, ao longo do dia, envolve caminhadas, escaladas ou passeios de bicicleta ao ar livre.
“Para o futuro, me vejo expandindo minhas atividades. Quero ajudar mais pessoas, sigo tentando influenciar o sistema de atendimento social e prisional. Me vejo aposentada aos 70 anos, vivendo na minha propriedade, que é ótima, ampla. Quero que as pessoas com um passado semelhante ao meu me visitem. E, é claro, quero mais netos.”