As próximas semanas serão decisivas para a eventual construção de uma novidade pista de pouso e decolagem no aeroporto de Navegantes, uma antiga demanda do setor produtivo e do governo de Santa Catarina que ficou de fora das obrigações da CCR Aeroportos no contrato de licença assinado em novembro de 2021 e que deu à empresa a governo do terminal por 30 anos.
Um grupo de trabalho para discutir a questão foi formado depois uma audiência de conciliação convocada pelo ministro do Supremo Tribunal Federalista (STF) Cristiano Zanin, em novembro de 2024. O objetivo do grupo é reunir, até 17 de março deste ano, os custos necessários para a obra e desapropriações, muito uma vez que os prazos para a efetiva construção de uma pista com 2,6 milénio metros de comprimento — a atual tem 1,8 milénio metros. Fazem segmento do grupo representantes de órgãos federais, do governo estadual, do município de Navegantes, da CCR e de instituições do setor produtivo catarinense.
A realização da audiência de conciliação foi considerada um “grande passo”, uma vez que classificou o secretário da Secretaria de Portos, Aeroportos e Ferrovias de Santa Catarina, Ivan Amaral, para destravar essa demanda. De vestuário, esse foi o maior progressão na ação cível originária (ACO) que o estado de Santa Catarina move desde 2021 contra a União questionando os termos da licença dos nove aeroportos do Conjunto Sul.
Na ação, o governo catarinense tentou suspender o leilão, no qual a CCR arrematou o conjunto por R$ 2,1 bilhões, sob a justificativa de que o edital não respeitava o projecto diretor do aeroporto de Navegantes de 2013, feito pela Infraero, que previa a construção de uma novidade pista, e de que determinados investimentos em outros aeroportos do conjunto não seriam necessários.
Na ocasião, o logo ministro do STF Ricardo Lewandowski, hoje ministro da Justiça e Segurança Pública, indeferiu o pedido “por não haver respaldo jurídico para a afirmação” de que o projecto diretor e os estudos de viabilidade do edital “seriam vinculantes”. Desde logo, a questão estava paragem no STF.
Aeroporto de Navegantes perdeu recursos no edital de licença
A mobilização do governo de Santa Catarina começou ainda no período de elaboração do edital de licença do Conjunto Sul, mormente depois a audiência pública realizada em 9 de março de 2020, em São José dos Pinhais, no Paraná. Naquele encontro, setor produtivo e governo paranaenses pressionaram representantes do governo federalista para a inclusão da construção da terceira do aeroporto Afonso Pena, na Região Metropolitana de Curitiba — pelos estudos iniciais de viabilidade, a obra não seria necessária para atender a demanda de movimento durante os 30 anos de licença.
Em seguida a audiência, a Secretaria de Aviação Social (SAC) recomendou a inclusão da novidade pista do Afonso Pena, causando um efeito dominó sobre os outros aeroportos do conjunto, com a redução na previsão de investimentos em todos os demais terminais, incluindo o de Navegantes, que saiu de R$ 545,5 milhões para R$ 446,1 milhões. A novidade pista de Navegantes, que já não constava uma vez que obrigatória desde o início do processo, foi enterrada de vez.
Sem uma novidade pista, o aeroporto de Navegantes ficou com um projecto de investimentos que envolvia, entre as principais obras, a ampliação da pista atual e a implantação de um novo terminal de passageiros e de um novo recinto de aeronaves. A princípio, essas obras seriam entregues logo nos primeiros anos de licença, mas por enquanto a CCR concluiu somente a ampliação da pista, que ganhou 110 metros de extensão. A construção do terminal ainda não começou, apesar da previsão de entrega para 2024.
Agora, com a formação do grupo de trabalho, a novidade pista volta à discussão. “Era um processo que estava morto”, reconhece o secretário Ivan Amaral. “O que temos que fazer é preservar o sítio aeroportuário, não deixar construções e pagar as indenizações. Fazendo isso, vamos buscar o reequilíbrio do contrato com a CCR”, propõe.
Desde a aprovação do projecto diretor do aeroporto, em 2013, o governo de Santa Catarina desapropriou mais de 200 milénio metros quadrados de superfície para poder permitir a construção de uma novidade pista em Navegantes. Para viabilizar a obra, mais indenizações teriam de ser pagas para liberar o espaço necessário. A ideia do governo estadual é fazer a própria segmento, inclusive com novos acessos ao aeroporto, para que a CCR fique somente com as obras da pista.
A CCR, por sua vez, mantém a mesma posição que apresentou em 2021 ao STF na ação movida pelo governo catarinense, quando justificou que “a pista existente é capaz de atender a demanda prevista no horizonte da concessão” e que “a frota considerada no projeto atende de forma satisfatória os destinos considerados no estudo de mercado”, não justificando “a obrigatoriedade da construção de uma [nova] pista”.
À Jornal do Povo, a CCR reiterou que “o contrato de concessão não prevê construção de uma segunda pista no aeroporto, mas que segue em diálogo com o poder público e o setor produtivo do estado sobre o tema.”
Novidade pista é crucial para turismo e cargas, diz setor produtivo
Os estudos de viabilidade que embasaram o edital de licença apontavam que a pista atual seria suficiente para a operação satisfatória do aeroporto. O setor produtivo catarinense, porém, discorda desse posicionamento e considera crucial a construção de uma novidade pista para atender o incremento do turismo na região e uma provável demanda reprimida pelo transporte de cargas.
“O Beto Carrero e mesmo o crescimento de Balneário Camboriú dependem da atividade aeroportuária. E hoje dependemos muito de Curitiba e Florianópolis”, argumenta o vice-presidente Regional do Vale do Itajaí da Federação das Associações Empresariais de Santa Catarina (Facisc), que faz segmento do grupo de trabalho formado na audiência conciliatória no STF. “Além disso, temos o problema da nossa carga, que chega por São José dos Pinhais ou Campinas e precisa descer por estrada. Isso não é competitivo”, acrescenta.
Outro argumento apresentado pelo setor produtivo é de que a atual pista pode travar o incremento dos portos de Itajaí e Navegantes. Uma das cabeceiras da pista está a 600 metros do curso do rio Itajaí-Açu, onde ficam as estruturas portuárias. Há projetos em curso para o aumento da capacidade das operações dos portos, mormente de contêineres, o que exigirá estruturas mais altas e que poderão conflitar com pousos e decolagens no aeroporto. Uma novidade pista, por outro lado, não seria um tropeço.
“Não podemos pensar no crescimento da região com essa pista atual e os obstáculos futuros. É uma questão técnica e econômica”, complementa o secretário da Secretaria de Portos, Aeroportos e Ferrovias, Ivan Amaral, que está esperançoso em um desfecho favorável ao governo. “Tudo caminha para que tenha êxito”, finaliza.
O desfecho, caso seja entendida a urgência de uma novidade pista, dependerá de um reequilíbrio no contrato assinado entre a União e a CCR. Entre as possibilidades está a desobrigação de outras obras não só em Navegantes, mas também em outros aeroportos do conjunto, muito uma vez que a extensão do período de licença, uma vez que ocorreu recentemente com o aeroporto de Guarulhos — a GRU Airport ficará com o aeroporto por 16 meses adicionais.