A ciência, a filosofia, a arte e a religião são as grandes atividades pelas quais a genialidade e a originalidade humanas melhor se expressaram, produzindo um tesouro de obras imponentes e admiráveis. As conquistas da filosofia e da ciência permitiram à humanidade investigar o mundo em várias dimensões, deslindar as complexas e intrincadas estruturas que o constituem, além de desenvolver tecnologias cada vez mais avançadas para sujeitar a veras ao seu domínio.
As criações artísticas (as belas-artes, a literatura e a música) afagam a vista, os ouvidos, a mente e o coração do varão. E a religião não foi menos fecunda em suas obras. Até o século XIX, a religião foi a força motriz da cultura. Zelou pela tradição, assegurou o legado greco-romano, preservou a instrução, a lei moral e o instinto civilizatório. Não se pode compreender as estruturas íntimas de uma sociedade e suas manifestações culturais se não se conhece muito seus postulados religiosos. A questão religiosa está no limiar de todas as grandes literaturas e filosofias da história.
Qualquer postura que ignore o fenômeno religioso pode ser comparada à conhecida passagem literária de Irmãos Karamazov, de Dostoiévski: Se Deus não existe, logo tudo é permitido
Evelyn Waugh, romancista inglês do século XX, é um dos escritores que têm uma visão sobrenatural da veras, de cunho metafísico. Reclamando da indignação de Edmund Wilson com a presença de Deus em Brideshead Revisited, ele diz: “Eu acredito que você só pode deixar Deus de fora se criar personagens que são pura abstração. (…) O fracasso dos romancistas modernos desde – e incluindo – James Joyce vem da presunção e da arrogância. Eles não estão satisfeitos com as figuras artificiais que até agora passaram graciosamente por homens e mulheres. Eles tentam representar toda a mente e a alma humanas, ao mesmo tempo omitindo sua característica determinante – a de serem criaturas de Deus com uma finalidade definida. Assim, em meus livros futuros haverá duas coisas para torná-los impopulares: uma preocupação com estilo e a tentativa de representar o homem de maneira mais completa, o que, para mim, significa apenas uma coisa: o homem em sua relação com Deus” (in Garcia, Rodrigo Duarte; Uma pequena experiência na arte do romance: Tolstói, Guerra e Tranquilidade).
Mesmo que a religião, nos dias de hoje, passe, em muitos campos internos, por um período de crise, isso não constitui um argumento plausível contra o peso específico da dimensão religiosa e a relevância histórica e cultural do fenômeno religioso: ele se impõe uma vez que uma regular do ser humano, mesmo que não seja cultivada por todos os membros de nossa espécie. Porquê já dizia Cícero em seus famosos discursos, o varão é naturalmente religioso, porque a veras que o circunda, com sua força, com seu fascínio e com seu terror, sugere a ele a existência de um Ser superior.
Tal fenômeno, no nível empírico, foi muito captado no Quadro do Ensino Religioso – Brasil 2023, relatório desenvolvido pelo Observatório da Religião na Escola (ORE) da Instauração SM, do qual intuito foi marcar um progressão na compreensão abrangente do ensino religioso no país e contemplar a flutuação cultural e religiosa de nosso povo.
Os resultados do relatório revelam a relevância do conhecimento religioso na formação dos estudantes e no processo pedagógico uma vez que um todo. O estudo demonstra uma vez que a disciplina escolar do ensino religioso contribui para a construção da identidade pessoal dos estudantes, promovendo valores essenciais em sociedade uma vez que assertividade, empatia, alteridade, diálogo e reverência.
Mas não é só. O ensino religioso faz com que os deveres civis sejam melhor compreendidos na perspectiva da justiça e do muito generalidade e, assim, transformam-se em condições fundamentais para a formação de uma sociedade vista por seus membros uma vez que uma moradia generalidade e não uma vez que um conjunto de muquifos atomizados. Também impressiona a percepção pedagógica da disciplina pelos próprios alunos em termos de florescimento individual global. Alguns indicadores dessa desenlace são muito incisivos:
• 67,3% dos(as) estudantes consideram que a formação religiosa os ajuda a serem mais responsáveis;
• 62,1% dos(as) estudantes avaliam que a formação religiosa os ajuda a serem mais ecológicos no zelo com o planeta;
• 71,2% dos(as) estudantes acreditam que o ensino religioso os ajuda a ser melhores cidadãos na vida social e política;
• 73,4% dos(as) estudantes reconhecem que o ensino das religiões os ajuda a ser melhores pessoas;
• 71,5% dos(as) estudantes consideram que o ensino das religiões os ajuda a ser mais respeitosos com as outras pessoas;
• 68,4% dos(as) estudantes consideram que a formação religiosa os ajuda a diferenciar o muito do mal.
No que tange à definição religiosa, dois em cada três estudantes se declararam católicos (66,3%), evangélicos (14,8%), de outras religiões (10,2%) e unicamente 1,7% são ateus, sendo que 6,6% se apresentaram uma vez que agnósticos. A desenlace dessa resposta é clara: 91% dos estudantes brasileiros afirmam que acreditam em Deus, levando em consideração a flutuação de crenças e religiões, embora haja uma clara predominância de católicos.
Qualquer postura que ignore o fenômeno religioso pode ser comparada à conhecida passagem literária de Irmãos Karamazov, de Dostoiévski: “Se Deus não existe, então tudo é permitido”. Isto é, se Deus não existe, logo, eu sou deus. Se Deus não existe, logo tudo é lícito, ou seja, se Deus não existe, a veras empírica não teria nenhum significado último, salvo se entendida uma vez que uma regular e perpétua obra de construção de sentido a que o varão estaria réprobo, uma espécie de trajecto de Sísifo de sua sobrevivência temporal.
Assim, compreende-se perfeitamente o porquê de Sartre fazer do varão o opífice trágico de sua núcleo, na medida em que está consciente do impasse, à luz dos postulados existencialistas, a que está talhado a ser: se a existência precede à núcleo, isto é, se o varão carece de qualquer lastro metafísico, só resta ao varão produzir uma núcleo para si mesmo. Não é à toa que, coerentemente, nosso filósofo existencialista, depois de virar a mesa da relação entre núcleo e existência do varão, impôs-lhe o fardo titânico de ser Deus, isto é, ser em si e para si.
Todavia, não é preciso chegar a esse ponto. Deus está no meio de nós e sua percepção foi amplamente captada pelo relatório já citado que, ao termo, não só é um importante termômetro para aprimorar ainda mais as habilidades e competências específicas do ensino religioso e provar seus efeitos positivos para seus alunos na vida em sociedade, mas também para recordar que o varão, desde sempre, sendo aluno ou não mais, é um ser acessível ao transcendente.
André Gonçalves Fernandes, Post Ph.D., é juiz de recta, redactor, professor de filosofia da Ateneu Atlântico e de filosofia do recta do Instituto Ives Gandra, pesquisador em filosofia da instrução pela Unicamp e membro da Ateneu Campinense de Letras.