Os novos nomes escolhidos por Lula para compor o Conselho Nacional de Educação (CNE) possuem currículos mais políticos do que técnicos. O presidente Lula indicou treze nomes, sendo oito para a câmara de Educação Básica e cinco para a de Ensino Superior. Dos oito indicados para a Educação Básica, cinco já ocuparam cargos políticos no Legislativo ou ao menos atuaram como secretários nacionais em gestões anteriores do PT. Alguns dos membros já se manifestaram contrários a pautas como homeschooling e educação cívico-militar.
Os membros do conselho tomaram posse nesta quarta-feira (13). A cerimônia foi presidida pelo ministro da Educação, Camilo Santana, e contou com a presença dos ministros do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes e Cristiano Zanin. A deputada federal e presidente do Partido dos Trabalhadores, Gleisi Hoffmann (PT-PR), também compôs a mesa.
O CNE é um colegiado técnico com caráter orientativo na formulação de políticas públicas educacionais. Iniciativas como a Base Nacional Comum Curricular, por exemplo, passaram pela apreciação do conselho.
São 24 conselheiros que compõem o órgão, dos quais dois são o secretário de Educação Básica e o secretário de Educação Superior do MEC. Esses são os primeiros conselheiros nomeados na gestão de Lula 3 e possuem o tempo de quatro anos de mandato. Os outros nove conselheiros indicados por Bolsonaro permanecem até novembro de 2026.
Durante a posse, Camilo pontuou quatro desafios para o CNE nos próximos anos: a avaliação e monitoração do novo Plano Nacional de Educação (PNE) – que estabelece diretrizes para a educação nos próximos 10 anos –, a elaboração das diretrizes nacionais para o ensino médio, a qualidade da educação a distância e a regulação de ensino superior, especialmente dos cursos de medicina.
Lula escolheu responsável pelo Conae 2024, evento marcado por pautas ideológicas
Heleno Araújo, presidente do Fórum Nacional de Educação e do Confederação Nacional dos Trabalhos de Educação, foi um dos nomeados por Lula. O FNE, sob a liderança de Araújo, foi responsável pela organização da Conferência Nacional de Educação (Conae) 2024, evento marcado por levantar pautas como ideologia de gênero e oposição ao agro em sala de aula. Durante a etapa nacional da conferência, participantes de direita foram hostilizados.
Frequentemente presente em eventos políticos do MEC e do presidente Lula, Heleno Araújo possui formação técnica na área de educação apenas em nível de graduação em Ciências Físicas e Biológicas. No Instagram, ele se apresenta como “professor da Educação Básica e Sindicalista”. Araújo tem anos de experiência em sindicatos, tendo presidido a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), que possui cerca de 50 sindicatos filiados, em 2017.
Givânia Maria da Silva, que também inicia seu mandato como conselheira, se colocou como “primeira representante quilombola” do CNE. À reportagem do Centro de Referências em Educação Integral, Givânia afirmou que “a população negra representa mais de 55% do povo brasileiro e eu sou a quinta pessoa negra e a primeira quilombola a ocupar uma cadeira no CNE”. Atualmente, ela é coordenadora da Coordenação Nacional de Articulação de Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ), mas já foi vereadora pelo PT na cidade de Salgueiro e secretária nacional de Políticas para comunidades tradicionais da em gestões do PT.
Ex-parlamentares são nomeados como conselheiros
O presidente Lula também nomeou os ex-deputados federais Israel Batista e Gastão Vieira para o CNE. Após perder as eleições de 2022, Israel Batista passou a atuar como consultor de relações institucionais do movimento Todos Pela Educação. O movimento já se posicionou contra o Programa Nacional de Escolas Cívico-Militares, instituído por Bolsonaro, e o homeschooling. Durante as eleições de 2022, a ONG manifestou apoio público a Lula. “A continuidade do governo Bolsonaro é incompatível com o avanço de uma agenda educacional de qualidade, equitativa e inclusiva”, diz o site do Todos pela Educação em sua aba de posicionamentos.
Gastão Vieira também é um político de carreira. Foram oito anos como deputado estadual do Maranhão e mais 28 anos como deputado federal na Câmara dos Deputados. Em 2011, primeiro ano de Dilma, chegou a ocupar o cargo de ministro do Turismo. Em uma entrevista à Gazeta do Povo, em 2021, Vieira criticou a Política Nacional de Alfabetização, elaborada pela equipe do professor Carlos Nadalim, na gestão de Bolsonaro.
De volta ao CNE, o sociólogo César Callegari já esteve na Comissão por 14 anos. Durante o tempo em que foi conselheiro, ele ficou à frente da Comissão de Elaboração da Base Nacional Comum Curricular. O sociólogo também passou por sindicatos, foi deputado estadual de São Paulo e ocupou diversos cargos no Executivo, como secretário da Educação Básica em 2012, época da ex-presidente Dilma.
Além dos nomes mencionados, Pilar Lacerda, Mariana Lúcia, e Cleunice Matos Kehem também integrarão a câmara de Educação Básica do CNE.
Médica cotada para ser ministra de Bolsonaro foi nomeada por Lula para o CNE
Ludhmila Hajjar, Celso Niskier, Monica Sapucaia e Otavio Luiz Rodrigues Júnior são os novos membros da Câmara de Educação Superior do CNE.
A Universidade de São Paulo (USP) considerou Hajjar, médica cardiologista, como uma de suas maiores pesquisadoras em Covid-19. O ex-presidente Bolsonaro chegou a cotá-la para ser ministra da Saúde durante a pandemia. Em 2021, Ludhmila se posicionou contra o tratamento precoce e favorável à obrigatoriedade da vacina da Covid-19 em crianças e ao lockdown. O seu posicionamento fez com que ela se destacasse na mídia como comentarista em assuntos relacionados à medicina.
Celso Niskier é filho do escritor e membro da Academia Brasileira de Letras (ABL), Arnaldo Niskier, e presidente da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior, uma das principais representantes das universidades particulares. Como o ministro Camilo Santana anunciou, um dos pontos de trabalho do CNE será a procura de soluções para a baixa qualidade dos cursos de graduação a distância; campo também de interesse de Celso.
Da área do Direito, Lula nomeou Monica Sapucaia, Maria Paula Dallari Bucci e Otavio Luiz Rodrigues Júnior. Sapucaia, doutora em Direito, compartilhou no LinkedIn sua satisfação por se tornar conselheira. Ela afirmou estar “profundamente comprometida em contribuir para a educação superior no Brasil, construindo pontes para o desenvolvimento da igualdade de gênero e a promoção dos direitos das mulheres”.
Ducci, também doutora em Direito, é professora da Universidade de São Paulo. No primeiro mandato de Lula, em 2003, ela foi consultora jurídica do MEC. Já na segunda gestão do presidente, a professora ocupou a cadeira de secretária de Ensino Superior, do MEC, de 2008 a 2010. Otávio Luiz Rodrigues Júnior tem doutorado em Direito Civil pela USP e pós-doutorado em Direito Constitucional pela Universidade de Lisboa.